MULHOLLAND DRIVE | 3 OUTUBRO | 21H30 | IPDJ (ENTRADA GRATUITA)



DIA 3 – IPDJ – 21H30
MULHOLLAND DRIVE

David Lynch, França/EUA, 2001, 147', M/12
(ENTRADA GRATUITA)

FICHA TÉCNICA
Realização e Argumento: David Lynch
Montagem: Mary Sweeney
Fotografia: Peter Deming A.S.C.
Música: Angelo Badalamenti
Interpretação: Justin Theroux, Naomi Watts, Laura Elena Harring, Ann Miller e Robert Forster
Origem: França/EUA
Ano: 2001
Duração: 147'


FESTIVAIS
Festival de Cannes – Prémio Melhor Realizador  


TRAILER




CRÍTICAS
De cada vez que estreia um novo David Lynch (com excepção do pouco lynchiano "Uma História Simples"), muito se discute a inteligibilidade do enredo. Nada de mais supérfluo: o universo do cineasta compõe-se de um onirismo recortado em imagens luminosas e plenas de cor. Como narrativa, "Mulholland Drive" agarra o espectador desde a primeira imagem: há um rigor extremo e um desvairado olhar sobre as formas fílmicas, que se complementam. Grande melodrama pulverizado pelo recurso ao sonho e à desordem da memória, "Mulholland Drive" inscreve no filme o melhor do imaginário "camp" dos anos 50 e a essência, em filigrana, da obra do cineasta. Talvez o melhor de todos os Lynch.
Mário Jorge Torres, Público 



O génio de David Lynch voltou a invadir Cannes, desta vez com um filme em oposição a UMA HISTÓRIA SIMPLES. Simples é o que este MULHOLLAND DRIVE não é. Aqui estamos no terreno das encruzilhadas com o surreal. O cenário é Hollywood, uma terra que em vez de sonhos surgem pesadelos. Pesadelos que incluem anões, teatros underground, monstros, mafiosos sinistros e uma caixa mágica.
Cabe tudo aqui, em especial a possibilidade de o cinema poder voltar a ser um pretexto escapista. Aclamado e incompreendido ao mesmo tempo, Lynch oferece aqui uma lição de desorientação – tão bela como sufocantemente assutadora.»
Rui Pedro Tendinha, Notícias Magazine


 
ENTREVISTA AO REALIZADOR
Em MULHOLLAND DRIVE, o seu último filme, David Lynch transporta para o grande ecrã um universo de estranheza e beleza, que as palavras não chegam para explicar. Mesmo depois de os produtores da cadeia televisiva ABC terem recusado o projecto da série de televisão com o mesmo nome, David Lynch tirou partido deste revés, criando um dos seus filmes mais surpreendentes. O realizador não dá explicações sobre certos elementos mais bizarros ou abstractos. O realizador prefere contar histórias hilariantes e deixar falar a música e as imagens.
MULHOLLAND DRIVE faz referência a uma Estrada sinuosa enquanto UMA HISTÓRIA SIMPLES seguia o percurso de uma linha recta.
MULHOLLAND DRIVE é uma Estrada fantástica, situada nas montanhas de Santa Mónica. Por momentos, atravessa uma zona residencial e, às vezes, assemelha-se a uma estrada de montanha, aberta e selvagem. À noite, é muito sombria. Há muitas histórias e experiências à volta dela. Tem grande poder de atracção e de mistério. Em certos sítios, oferece uma vista panorâmica de Los Angeles e do vale. Quando está bom tempo, podem ver-se as ilhas Catalinas. É uma bela experiência, tanto de noite como de dia.
Entre a recusa para a série de televisão e o início da rodagem para fazer o filme, o que é que aconteceu?
O Canal+ e o Pierre Edelman propuseram-me retomar o projecto para fazer um filme. Foi preciso um ano só para voltar a adquirir os direitos.
No final do ano passado não tinha a mínima ideia da forma como ia transformar num filme coerente aquilo que eu já tinha filmado. Mas, uma noite, sentei-me e, durante cerca de meia hora, reuni as ideias todas. Escrevi cenas adicionais e fomos rodar durante quatro semanas.
Estas ideias novas mudaram aquilo que eu já tinha, e o que filmámos depois afectou princípio, meio e fim.
Com os seus sonhos e desilusões, podíamos defini-lo como um hino à mitologia hollywoodesca.
Hollywood é um grande reservatório de metodologia, um grande receptáculo de esperança. Ali as pessoas acreditam que se vão poder expressar e ficar famosas. Por isso há tanta gente a desembocar ali, à semelhança das pessoas que se sentem atraídas por Las Vegas e pela perspectiva de grandes ganhos. Mas são poucos aqueles que o conseguem.
Quais foram os problemas que encontrou?
Só encontrei problemas. Os décors, o guarda-roupa, perdeu-se muita coisa ao longo deste ano (de inactividade). Tenho que dizer que é curioso ver a negligência nesse tipo de situações. Milagrosamente, encontrámos aquilo que se tinha perdido, acabámos por juntar tudo e só assim pudemos continuar.
Há elementos que se tenha arrependido não desenvolver?  
Não. Penso que esta história sempre teve aspirações para se tornar num filme. Acontece que tomou um caminho estranho. Na minha opinião, este desenvolvimento em duas fases foi uma benção. As ideias que apareceram entretanto não teriam surgido se o projecto tivesse sido concebido inicialmente como uma longa-metragem.
Pode dizer-nos quais foram as cenas que rodou especialmente para o filme?
Não (risos).
Na cena da conferência, pode pensar-se que você se aproveitou para acertar contas com os executivos do estúdio, servindo-se de um realizador sem iniciativa alguma.
Sim, os executivos tomam as decisões no seu lugar. É uma questão de poder. É assim que acontece na maior parte das vezes em Hollywood. Na França, não nos apercebemos disso porque o director de actores ou o pintor ou o escultor têm as chaves da liberdade. Em Hollywoood, o realizador é frequentemente um cidadão de segunda categoria.
Porque é que deu o papel de produtor a Angelo Badalamenti?
Angelo é um compositor, mas eu sei que sempre sonhou representar. A experiência prova que ele tem mesmo talento como actor, mas receio ter criado um monstro. Parece-me que vai ser muito difícil trabalhar com ele a partir de agora.
Podemos encarar a personagem do cowboy como sendo equivalente ao homem de negro de ESTRADA PERDIDA, uma espécie de intermediário entre dois universos?
Não me agrada especialmente deter-me sobre o significado das coisas. Aquilo que posso dizer é que há uma tradição de actores cowboys em Hollywood. É uma espécie em vias de extinção, mas que ainda subsiste. Eles fazem parte de um grupo muito especial, vivem a sua própria vida, não nadam na mesma água dos outros actores. O facto de, nesta cidade conhecida pelos gangs de rua, ainda existirem cowboys, sempre me fez sonhar.
E de onde vem o fato dele?
É Monty Montgomery. É meu amigo há muito tempo e perguntei-lhe se queria fazer de cowboy. Ele traz a sua própria roupa. Ele colecciona muito este tipo de coisas. O chapéu que ele usa pertenceu mesmo a Tom Mix. Monty foi produtor de CORAÇÃO SELVAGEM. Foi ele quem me sugeriu que lesse o livro. Ele queria realizá-lo. Naquela altura, eu tinha previsto que se poderia tornar um filme, depois de o ter lido. Dizia-o na brincadeira, mas veio a confirmar-se.
Como explica que os seus filmes se tornem mais claros quando os revemos?
Na maior parte das vezes basta-nos ver um filme uma vez para o percebermos. Mas certos filmes, como o 8 e ½ de Fellini, têm abstracções que não se revelam antes de dois ou três visionamentos. O mesmo é válido para os filmes do Kubrick: aprecio-os mais de cada vez que os vejo. Em certos casos, os universos são tão ricos que temos forçosamente que os habitar. Se pudesse, via O Crepúsculo dos Deuses (de Billy Wilder) todos os dias.
Pode dizer-se que Kubrick o influenciou?
É possível. Sei que ele adorou o ERASERHEAD, o que me encheu a alma.
O que está a preparar neste momento?
Trabalhei durante dois anos num site na Internet, que estamos à espera de lançar a qualquer momento. Queríamos lançá-lo em simultâneo com a estreia de MULHOLLAND DRIVE, mas não estava tudo pronto. Fiz muitas coisas experimentais, como três séries novas concebidas expressamente para a Net. Tem imensas secções onde qualquer um se pode perder. É um ponto de partida. Não se sabe onde é que vai dar, mas não pára de mudar.
Gerard Delorme, Premiere