"QUEM TEM MEDO DE" ELIZABETH TAYLOR? Jardins da Sede, 4ªf, 22h, entrada livre.


águas e cervejinhas geladas a 1€ (pra ajudar a malta... :-)

QUEM TEM MEDO DE VIRGINIA WOOLF?

de Mike Nichols

Imagine-se um jovem realizador a quem “sai na rifa” dirigir, logo à primeira longa, o casal de estrelas de cinema mais badalado da época, e receber a imprensa de todo o mundo logo no primeiro dia de filmagens. Imagine-se, em seguida, que esse filme adapta ao cinema uma peça que é tudo menos um produto óbvio para o "star system" que ainda é o centro da produção hollywoodiana, e que o faz sem cedências ao convencionalismo ou ao conservadorismo dominantes.

Isto tudo para explicar que "Quem Tem Medo de Virgínia Woolf?" , êxito de bilheteira aclamado pela critica, nomeado para treze Oscares da Academia e vencedor de cinco, é uma espécie de milagre: um filme notável onde tudo podia ter corrido mal (a começar pela reunião no ecrã do tumultuoso casal Elizabeth Taylor/ Richard Burton) mas onde tudo correu improvavelmente pelo melhor. O próprio Mike Nichols admite isso: "Quem Tem Medo de Virginia Woolf?" foi uma "operação de guerrilha" no interior do sistema cada vez mais desagregado dos estúdios. Numa espécie de "prenúncio" da vaga de jovem cinema americano que começaria a desabrochar no ano seguinte com "Bonnie e Clyde" , as circunstâncias conspiraram para um resultado final que conseguia ser inovador para o habitual da produção Hollywoodiana sem trair a crueza do material de origem nem destoar nas fachadas das salas populares.



A peça de Edward Albee, estreada em 1962, encena um "jeu de massacre" à volta de um casamento dilacerado no espaço de uma noite. George, professor de história, e a sua mulher Martha, filha do presidente da universidade, recebem um casal recém-chegado que se toma testemunha e participante dos jogos psicológicos que George e Martha mantêm permanentemente, onde a verdade e a ficção estão constantemente a trocar de fronteiras e a humilhação verbal é a palavra de ordem. Viagem alucinante e claustrofóbica aos abismos de uma relação onde o amor e o ódio se cruzaram até já não se conseguirem distinguir, a peça foi bem servida por uma adaptação cinematográfica que manteve intacta a estrutura, construção e diálogos originais mas, segundo Nichols, "preencheu os vazios que não se podiam ver em palco" .
Nichols ainda não era então o cineasta de "A Primeira Noite", "Iniciação Carnal", "Anjos na América" ou "Perto Demais" - era apenas um homem do teatro que dava com "Virgínia Woolf" os primeiros passos no cinema parecendo compreender instintivamente o que diferenciava ambas as artes. A reprodução intacta do ambiente claustrofóbico da peça, com apenas quatro papéis principais, é feita através de uma alternância entre takes longos e cortes rápidos, grandes planos quase invasivos e composições de conjunto impecavelmente geridas, desorientando a espaços o espectador com câmaras ao ombro e zooms velozes. Mas os truques visuais nunca distraem do essencial - são as performances uniformemente extraordinárias dos actores que transportam o filme, e se foram Elizabeth Taylor e Sandy Dennis que levaram os Óscares para casa, seria escandaloso "não mencionar as interpretações igualmente assombrosas de Richard Burton e George Segal.


A peça fora comprada por Jack Warner para Bette Davis e James Mason; Nichols foi contratado a pedido expresso de Taylor (o realizador originalmente escolhido era John Frankenheimer); a fotografia a preto e branco foi imposta por Nichols contra a vontade de Warner, essencialmente para permitir a Taylor, muito mais jovem que a sua personagem, ser credível no papel.

Importância do filme no seu tempo: quer em termos técnicos (graças à utilização da câmara à mão e da sobreposição de diálogos na montagem de som, técnicas inéditas em Hollywood), quer em termos socioculturais (foi um dos primeiros filmes "adultos" estreados pelos grandes estúdios, antecipando de poucos meses a entrada em vigor da classificação etária que ainda hoje existe).

Público, 8/1/10



NUMA PALAVRA: NUNCA VIRAM NADA ASSIM...



Título original: Who's afraid of Virgínia Woolf?
Realização: Mike Nichols
Argumento: Ernest Lehman, baseado na peça de Edward Albee
Direcção de Fotografia: Haskell Wexler
Música: Alex North
Interpretação: Elizabeth Taylor, Richard Burton, Sandy Dennis e George Segal
Origem: EUA
Ano: 1966
Duração: 131’

Sem comentários: