DIA 19 DE FEVEREIRO - "MUITOS DIAS TEM O MÊS", Margarida Leitão, Portugal, 2009, 91’, M/12
SINOPSE
Hoje tudo nos parece
indicar que a felicidade está ao nosso alcance. Com um simples gesto de um
cartão de crédito ou um telefonema, passamos a ter o que não ousávamos. Os
nossos sonhos tornam-se realidade. Por todo o lado somos seduzidos por uma
publicidade atractiva a adquirir bens que vão desde do indispensável e básico
até ao mais supérfluo. O recurso ao crédito vulgarizou-se e o consumo
democratizou-se. Hoje várias pessoas vivem uma angústia que se repete todos os
meses: serão capazes de pagar os seus empréstimos e sobreviver até ao mês
seguinte? Pessoas endividadas que vivem as suas vidas ao ritmo quotidiano dos
prazos, obrigações e do esforço para retomarem controlo das suas vidas. Mês a
mês. Dia a dia. Tudo na sociedade tem aparentemente um preço. Mas, qual é o
preço das nossas necessidades? Qual é o preço dos nossos sonhos? Qual é o nosso
preço? Será que estamos dispostos a pagá-lo?
(...) a
primeira longa de Margarida Leitão é um pequeno murro no estômago que vai
direitinha à crise financeira global.
Trata-se de seguir o quotidiano de um grupo de
portugueses que se endividou para lá das suas capacidades financeiras.
Famílias, mulheres separadas, homens solteiros que se deixaram seduzir pelo
crédito fácil sem ler as letras miudinhas, que o desemprego ou a doença
(própria ou de familiares) forçou a cair na espiral da dívida.
Não se trata aqui de propor soluções mágicas, de
contar histórias exemplares, de pedir compaixão ou apresentar vias sacras de
redenção. Margarida Leitão é muito mais neutra: deixa as pessoas contarem as
suas histórias em off, enquanto a imagem as mostra a fazerem as suas vidas no
dia-a-dia.
Essa montagem desfasada contrasta o sofrimento
resignado que transparece das vozes com as imagens plácidas e banais de uma
lida da casa, uma conversa na rua, uma refeição que se cozinha. E o filme
ganha-se nesse distanciamento aparente que, a par com a ausência de narração
externa, evita a queda na simples reportagem televisiva e acaba por nos
aproximar desta gente. Mesmo que sintamos que o pequeno écrã é o seu habitat
natural e que um ou outro momento é supérfluo ou redundante relativamente ao
essencial do filme.
Jorge Mourinha, Ipsilon
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