O Silêncio.
Quantas vezes e de quantas maneiras quis escrever sobre coisas que vi de Antonioni? Quantas vezes escrevi pedaços de coisas sobre sensações que vi sentir por Antonioni? Lembro-me, com certeza, de memória, de frases escritas, de dois textos-ideia diferentes e de mais uma carta/novela sobre uma ida ao cinema com uma amiga italiana em Lisboa – Profissão Repórter.
Textos que nunca acabei por tanto neles querer dizer e encontrar coisas que ilustrassem e sublinhassem o que os filmes e os escritos de Antonioni evocaram.
Lembro-me de, uma noite, em Milão, certa vez, ter-me dado a ver La Notte Gabriele Basilico, um homem de olhar imenso que guarda com fulgorosa serenidade a vida dos lugares que fotografa. Vimos o filme, embalados pela conversa à volta de Antonioni e saímos, na noite, à sua procura em dois edifícios de tijolo, estilo "liberty" numa zona no centro. Foi como poder dar a mão a um actor nos bastidores de um teatro no final de uma representação. A luz dessa noite fez aumentar o encanto do passeio e toda a Milão pareceu entrar nesse profundo silêncio que envolve os filmes de Antonioni, um silêncio que é também espaço suspenso, um silêncio que Antonioni iluminou descobrindo mil faces. O silêncio do momento de um eclipse (L'Eclisse), o silêncio contido de uma explosão (Zabriskie Point), o silêncio de um vulto escondido nos sais de prata de uma fotografia (Blow Up).
Mas o mais material dos silêncios, que fez construir a passagem para um lugar estranho, fora do filme e fora do espaço da sala de cinema foi o silêncio das vozes altas, crú e demorado, ensurdecedor, dos gritos dos estudantes numa assembleia para uma manifestação em Zabriskie Point e dos ecos dos gritos romanos dos correctores de bolsa, alternados com o som abafado do interior de uma cabine telefónica, em L'Eclisse. Foi esse o som que sempre me marcou nos seus filmes, o som do vazio dos movimentos frenéticos de uma coisa indistinta – de uma moltitudine de pessoas e barulho, transformadas em paisagem distante e silêncio.
(por que é que sinto tal buraco no meio do peito?)
«Nem Harriet Andersson, nem Liv Ullmann, nem Bibi Anderson, nem Erland Josephson - nem ninguém - vão voltar a receber telefonemas de duas horas. Há uma espécie de família que perdeu a sua espécie de patriarca.»
Luís Miguel Oliveira, Público, 31.07.2007
Luís Miguel Oliveira, Público, 31.07.2007
O Deserto (Ou: Cinema Negro)
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Antonioni enganou-se: era para se ter tornado em devorador da morte, ao mesmo tempo que os seus filmes nisso se transformavam. Ou não. Talvez ele tivesse acabado consigo mesmo quando sujeitou à erosão mais dispersiva as imagens do deserto de Death Valley. Não satisfeito com a explosão de uma vivenda de luxo, tinha ainda feito inçar de amantes e amores as dunas embriagadas do ponto de Zabriskie.
(Anabela, fáfavor de deixar a correr aqui ao ladinho uma guitarrada de Jerry Garcia, qualquer uma das muitas que se ouvem neste filme. Agradecida.)
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oh... (bolas!!) :-(
addio, signore antonioni.
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(consigo aprendi a solidão. cineasta da incomunicabilidade? não: entendemo-nos tão bem, sr. antonioni. nessa solidão que é a de cada qual.)
(tanto que me deu. tanto. de tudo, difícil escolher. este, porventura. poesia feita vento nas árvores. o senhor sabia tanto, sr. antonioni. sabia tanto...)
Blow-Up, 1966
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(consigo aprendi a solidão. cineasta da incomunicabilidade? não: entendemo-nos tão bem, sr. antonioni. nessa solidão que é a de cada qual.)
(tanto que me deu. tanto. de tudo, difícil escolher. este, porventura. poesia feita vento nas árvores. o senhor sabia tanto, sr. antonioni. sabia tanto...)
Blow-Up, 1966
10 anos... já!!
Centro de Ciência Viva do Algarve.
Colaborámos diversas vezes.
Com todo o prazer, também nestas comemorações do 10º aniversário.
Sempre às 21h, sempre de entrada livre, sempre no Jardim do Centro de Ciência Viva.
Os filmes são muitA bons. Ficam os trailers:
Dia 3, GENESIS, de Claude Nuridsany e Marie Pérennou.
Dia 4, KOYAANISQATSI - LIFE OUT OF BALANCE, de Godfrey Reggio.
Dia 5, UMA VERDADE INCONVENIENTE, de Davis Guggenheim, com Al Gore.
(mais informações daqui a pouco no nosso site)
Colaborámos diversas vezes.
Com todo o prazer, também nestas comemorações do 10º aniversário.
Sempre às 21h, sempre de entrada livre, sempre no Jardim do Centro de Ciência Viva.
Os filmes são muitA bons. Ficam os trailers:
Dia 3, GENESIS, de Claude Nuridsany e Marie Pérennou.
Dia 4, KOYAANISQATSI - LIFE OUT OF BALANCE, de Godfrey Reggio.
Dia 5, UMA VERDADE INCONVENIENTE, de Davis Guggenheim, com Al Gore.
(mais informações daqui a pouco no nosso site)
Morreu o Bergman? Viva o Bergman!
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Morreu. Com ele, morreu um bocado da Suécia, um bocado bom. Com ele, viverá sempre um bom bocado do melhor Cinema que por aí se fez e um dos melhores bocados da magia do claro-escuro cinéfilo, já para não falar do claro-escuro da magia das almas e das personalidades. Adeus Bergman! Que vivas Bergman!
Chorar um morto
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Leio Ernesto de Martino no dia da morte de Ingmar Bergman: "Entre as mulheres do campo na região da Lucânia, os riscos psíquicos da crise atingem tal amplitude e gravidade que conferem ao luto um sinistro poder de desmembramento e loucura." A gravidade e a amplitude do luto por Bergman serão gigantescas - mas em silêncio e só um sopro de movimento e luz. Numa sala obscurecida.
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oh...
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farewell, mister bergman.
how can we ever thank you for your films?
showing them, discussing them, loving them?
that's a deal, mister bergman. it always was, here at the faro cineclub*.
so long, rest in peace.
(fica este [oportuno...] link, simplesmente porque o video correspondente não apresenta embed code)
* clicar aqui, e escrever Bergman no Campo "Realizador" (mesmo assim, a lista está incompleta)
já agora, livros de e/ou sobre que temos na nossa biblioteca (escrever Bergman no campo "Nome do Realizador")
e, por último (também uma lista incompleta), os filmes que temos em vhs/dvd (de novo, escrever Bergman no campo "Realizador")
[explicação extra: estas listas estão incompletas porque a actualização das bases de dados é um serviço que pagamos à parte ao nosso webmaster, e dinheiro é algo que - DEFINITIVAMENTE!! - não abunda por estas bandas]
Mais postais de NY
(reparem como me mantive fiel ao espírito que defendia para blog e não coloquei aqui uma janela ostensiva com as minhas fuças...)
Até ao próximo!
Happy hour
À falta de copos de três e de velhotes de tasca com quem comentar a compra do Derlei (quem??) pelo Sporting, ganhei o (péssimo) hábito de me sentar sozinha ao balcão dos bares nova iorquinos durante a happy hour. Uma coisa degradantíssima, nem vos conto.
Era o West side, a rua era a Bleecker, a bebida, margarita, a hora imprópria (para parâmetros americanos era sim imprópria, umas oito à vontade), e eu feita Carrie Bradshaw num dia mau ao balcão de um bar mais ou menos.
Anyway, to cut to the chase, um rapaz pergunta se pode sentar-se no banco ao lado do meu. Boy, can you??, digo eu, certa de que ele não perceberia porque, a) a música estava alta; b) para disfarçar o meu contentamento, tinha feito o habitual ar de couldn't care less à Lauren Bacall, o que, em mim, resulta sempre em algo como Maria von Trapp meet Dory do Finding Nemo mas que nem por isso deixa de servir o seu propósito, ou seja, desconcertar o próximo. Adiante.
O rapaz, parece, é filmmaker. É o que diz aqui no cartão que me deu, e foi como filmmaker que se apresentou. Assim mesmo, Robert --, mão esticada para receber um passou-bem e entregar ao mesmo tempo, com uma flexibilidade que me estonteou, ou seriam as margaritas, o seu business card. Eu deixei de parte a Lauren Bacall, ou a Julie Andrews, tanto faz (a Ellen DeGeneres já tinha deixado muito antes) e, no meu melhor ar de Pauline Kael, respondi, Marina --, film critic.
O cartão de apresentação voou das minhas mãos e voltou para a carteira dele (como o tenho de novo comigo é o MacGuffin desta história, agora vão ter de ler até ao fim). Vi depois no olhar dele que pensava e reconsiderava, a tipa se calhar escreve para os Cahiers ou algo assim estrangeiro, é melhor pensar e reconsiderar. Então fez o pitch do filme. E devolveu-me o cartão. Também me ofereceu uma cerveja. Eram já perto das oito e meia da noite, a sede impunha-se, a vida de um crítico não é fácil.
Às nove estava em casa. Na televisão, o jogo dos All Star no estádio dos Giants em San Francisco. A alternativa era sentar-me à máquina (sempre quis dizer isto) e rememorar o meu dia na cidade.
É, de facto, a cidade perfeita para se ser filmmaker. Ou film critic. Ou nem uma coisa nem outra mas acreditar que sim. Sobretudo acreditar.
Bebamos a isso.
Era o West side, a rua era a Bleecker, a bebida, margarita, a hora imprópria (para parâmetros americanos era sim imprópria, umas oito à vontade), e eu feita Carrie Bradshaw num dia mau ao balcão de um bar mais ou menos.
Anyway, to cut to the chase, um rapaz pergunta se pode sentar-se no banco ao lado do meu. Boy, can you??, digo eu, certa de que ele não perceberia porque, a) a música estava alta; b) para disfarçar o meu contentamento, tinha feito o habitual ar de couldn't care less à Lauren Bacall, o que, em mim, resulta sempre em algo como Maria von Trapp meet Dory do Finding Nemo mas que nem por isso deixa de servir o seu propósito, ou seja, desconcertar o próximo. Adiante.
O rapaz, parece, é filmmaker. É o que diz aqui no cartão que me deu, e foi como filmmaker que se apresentou. Assim mesmo, Robert --, mão esticada para receber um passou-bem e entregar ao mesmo tempo, com uma flexibilidade que me estonteou, ou seriam as margaritas, o seu business card. Eu deixei de parte a Lauren Bacall, ou a Julie Andrews, tanto faz (a Ellen DeGeneres já tinha deixado muito antes) e, no meu melhor ar de Pauline Kael, respondi, Marina --, film critic.
O cartão de apresentação voou das minhas mãos e voltou para a carteira dele (como o tenho de novo comigo é o MacGuffin desta história, agora vão ter de ler até ao fim). Vi depois no olhar dele que pensava e reconsiderava, a tipa se calhar escreve para os Cahiers ou algo assim estrangeiro, é melhor pensar e reconsiderar. Então fez o pitch do filme. E devolveu-me o cartão. Também me ofereceu uma cerveja. Eram já perto das oito e meia da noite, a sede impunha-se, a vida de um crítico não é fácil.
Às nove estava em casa. Na televisão, o jogo dos All Star no estádio dos Giants em San Francisco. A alternativa era sentar-me à máquina (sempre quis dizer isto) e rememorar o meu dia na cidade.
É, de facto, a cidade perfeita para se ser filmmaker. Ou film critic. Ou nem uma coisa nem outra mas acreditar que sim. Sobretudo acreditar.
Bebamos a isso.
Notícias do Artur (a.k.a. Art, ou ainda A) :)
Deadman- Realização Jim Jarmusch- Música Neil Young
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Nascido a 22 de Junho de 1953 no Ohio, Jim Jarmusch constituíu-se, nos anos 80, como principal rosto do "cinema independente americano", depois muito copiado e muito imitado. Aluno de Nicholas Ray e de Laslo Benedek na escola de cinema de Nova Iorque, uma das forças do cinema de Jim Jarmusch reside justamente no balanço perfeito entre "classicismo" e "modernidade", tanto no modo de fazer como nos universos e referências convocados.
Dead Man é a história da viagem, física e espiritual, de um jovem a um território que lhe é pouco familiar. William Blake viaja para o Oeste americano, algures na segunda metade do século XIX. Perdido e ferido, encontra-se com um índio solitário e excêntrico, chamado “nobody”, que acredita que Blake é o falecido poeta inglês com o mesmo nome.
Nobody e William Blake passam por situações cómicas e violentas. Contrariamente à sua natureza, as circunstâncias transformam Blake num fora-da-lei perseguido, num assassino e num homem cuja integridade física vai ficando em risco. Atirado para um mundo que se revela cruel e caótico, os seus olhos abrem-se para a fragilidade que define a esfera da vida.
Nobody e William Blake passam por situações cómicas e violentas. Contrariamente à sua natureza, as circunstâncias transformam Blake num fora-da-lei perseguido, num assassino e num homem cuja integridade física vai ficando em risco. Atirado para um mundo que se revela cruel e caótico, os seus olhos abrem-se para a fragilidade que define a esfera da vida.
Com a magistral banda sonora de Neil Young acho que o filme ganhou outra dimensão , por isso
se quiserem talvez pela primeira vez visionarem o videoclip do filme deixo-vos aqui o link.
A banda sonora é genial se alguém desejar adquiri-la é só dizerem pois tenho-a.
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“Eraserhead – No Céu Tudo é Perfeito” é a porta principal para entrar no mundo do realizador americano que herdou as vanguardas cinematográficas europeias. Primeira longa-metragem de David Lynch, datada de 1977, apresenta-se como um clássico do cinema de autor.
A propósito da mais recente exibição do novo filme de david lynch "INLAND EMPIRE",
achei relevante este post , visto ter sido este o primeiro filme de lynch, embora ele já tivesse feito algumas curtas anteriormente.
Reuni alguns frames do filme e fiz uma pequena brincadeira , uma singela homenagem a este
grande realizador e ao seu filme.
sugestão do miguel. em recente comentário ao post 'from her to eternity'
(simple men, hal hartley; ???, sonic youth)
(alguém arranja em formato audio? e manda por mail? pra vir a figurar no 'cineclubando' ali ao lado?)
actualização de uma polémica 'antiga'
recebemos hoje o seguinte comentário de 'Pedro' ao post 'esclarecimentos :)))))'.
passado um mês, o que pelo menos prova a vitalidade e importância da discussão que ele motivou. :-)
pareceu-me uma perspectiva importante demais para ficar soterrada numa caixa de comentários que entretanto já estava 'caduca' (só no arquivo)
"Pessoal
desculpe-me a intromissão, mas achei que poderia se oportuno. Não vamos aqui nem Defender Deleuze, nem condenar Deleuze. Deleuze não é o que importa aqui. Ele nem é a " última coca-cola gelada do planeta em dia de calor" mas é um dos mais criativos pensadores contemporâneos. Minha mãe nunca leu Deleuze e nem por isso deixa de ser feliz. Talvez nunca precise de Deleuze. Deleuze é como uma caixa de ferramentas. Quem já tem suas ferramentas não há o que procurar em Deleuze. Ele mesmo falava que o que importa em uma teoria é que faça a mesma funcionar. Quem encontra o que fazer com Deleuze, que faça e faça bem feito. Os demais que não usem. Agora também fazer críticas baratas a um pensador importante não é uma postura das mais interessantes. É melhor dizer que não conseguiu ver o que fazer com suas teorias do que se colocar num pedestal e sair atirando em algo que talvez sequer entendeu.
Fraternalmente."
bem vindo, 'Pedro'!
passado um mês, o que pelo menos prova a vitalidade e importância da discussão que ele motivou. :-)
pareceu-me uma perspectiva importante demais para ficar soterrada numa caixa de comentários que entretanto já estava 'caduca' (só no arquivo)
"Pessoal
desculpe-me a intromissão, mas achei que poderia se oportuno. Não vamos aqui nem Defender Deleuze, nem condenar Deleuze. Deleuze não é o que importa aqui. Ele nem é a " última coca-cola gelada do planeta em dia de calor" mas é um dos mais criativos pensadores contemporâneos. Minha mãe nunca leu Deleuze e nem por isso deixa de ser feliz. Talvez nunca precise de Deleuze. Deleuze é como uma caixa de ferramentas. Quem já tem suas ferramentas não há o que procurar em Deleuze. Ele mesmo falava que o que importa em uma teoria é que faça a mesma funcionar. Quem encontra o que fazer com Deleuze, que faça e faça bem feito. Os demais que não usem. Agora também fazer críticas baratas a um pensador importante não é uma postura das mais interessantes. É melhor dizer que não conseguiu ver o que fazer com suas teorias do que se colocar num pedestal e sair atirando em algo que talvez sequer entendeu.
Fraternalmente."
bem vindo, 'Pedro'!
Peixes e cães (ou, Lynch, mais uma vez)
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(*Em Catching the Big Fish: Meditation, Consciousness, and Creativity, onde explica as suas motivações criativas e conta este episódio, Lynch diz que não estava sob o efeito de drogas.)
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New York, New York
Incompreensível Lynch
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Inland Empire é uma obra belíssima. Uma vez mais, depois de Mulholland Drive, depois de Lost Highway, de Laura Palmer, depois de Blue Velvet, Eraserhead, nem sei mais quantos nem quais, volta a pisar os riscos de uma terra entre o aqui e o nunca - entre o que escapa à compreensão de instrumentos não mais do que cartesianos, racionais; e aquelas zonas de sombra que a razão, certeira, nem sempre conhece. Desta vez, perdeu-se no rosto de Laura Dern. Confundiu nele os rostos das mulheres confusas que habitam Santa Monica Boulevard, que calcorreiam as confusas ruas de uma cidade de anjos - todos eles desertores de um combate, sem que se perceba se fugiram dali ou se foi ali que se refugiaram. Confundiu num rosto muitos, assim como muitas estradas numa só. E num rosto único contou pedaços de histórias de mil rostos, atravessados pela aura dos anjos que ainda não sabem se já se deu o choque com o chão ou se ainda pairam, sem peso e de olhos carregados, sobre as lixeiras imensas dos mundos de ilusões.
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