BOYHOOD | 6 AGOSTO | Q - ESPAÇO CULTURAL | 21H30


BOYHOOD: MOMENTOS DE UMA VIDA
Richard Linklater, EUA, 2014, 165’, M/12

FICHA TÉCNICA
Título original: Boyhood
Realização e Argumento: Richard Linklater
Montagem: Sandra Adair
Fotografia: Lee Daniel, Shane F. Kelly
Interpretação: Ellar Coltrane, Patricia Arquette, Ethan Hawke
Origem: EUA
Ano: 2014
Duração: 165’

PRÉMIOS
BAFTA: Melhor Filme, Melhor Realizador, Melhor Atriz Secundária








CRÍTICAS
O tempo que passa é o verdadeiro tema do melhor filme de Richard Linklater, rodado ao longo de doze anos.
Ao princípio de Boyhood, quando Mason (Ellar Coltrane), o miúdo cujo crescimento acompanhamos ao longo de uma década, tem apenas seis anos, vemo-lo a ouvir no quarto a mãe (Patricia Arquette) a discutir com um namorado e a dizer que, entre trabalhar e criar sozinha dois filhos, “já não sei o que é ir ao cinema ou sair à noite”.
Já perto do final, quando Mason está à beira de partir para a faculdade e recolhe os últimos pertences, agora que finalmente os filhos já são maiores e vacinados e estão fora de casa e ela pode “voltar a ter uma vida”, a mãe diz “é o pior dia da minha vida”. “É só isto? Pensei que houvesse mais alguma coisa.”
É precisamente esse “só isto” que está no centro do filme com que Richard Linklater sucede à trilogia de culto formada por Antes do Amanhecer, Antes do Anoitecer e Antes da Meia-Noite - de caminho o melhor filme de uma obra inquieta mas irregular. A vida é, de facto, “só isto” - este retrato de uma adolescência banal, marcado pela simplicidade das conversas encavacadas com a família ou dos primeiros beijos ou das primeiras bebedeiras, pode no entanto ser muito mais do que pode parecer. Basta parar e, mais do que olhar, ver. É a isso que Linklater nos desafia ao longo de quase três horas, rodadas em intervalos incrementais ao longo de doze anos: a ver cenas de uma vida familiar, banal. Porque é o tempo que dá ressonância às coisas, e o que agora nos parece descartável ou desinteressante pode, com o tempo, ganhar uma relevância completamente diferente. O verdadeiro tema de Boyhood é o tempo que passa, e como, ao passar, vai estratificando uma narrativa, uma personagem, uma identidade – as três horas do filme não só não são supérfluas como cristalizam a sua própria essência. Porque, ampliado para o écrã grande, visto com o recuo do tempo que passa, é o banal que faz de nós quem somos.
Linklater não está aqui para nos enfiar lições de moral pela goela abaixo nem para pintar as coisas de cores garridas: ninguém neste filme, a começar pelos pais divorciados (Arquette e o cúmplice Ethan Hawke), é santo, nunca ninguém disse que isto é fácil e a vida não vem com manual de instruções. É por isso que, chegados ao fim, temos a sensação de ter visto a vida como ela realmente é. E poucos – quase nenhuns - filmes o mostraram com tanta e tão desarmante simplicidade. 
Jorge Mourinha, publico.pt/


O que tem de mais extraordinário este filme é o facto de as filmagens terem durado cerca de 12 anos, ou seja, o realizador Richard Linklater, filmou durante doze anos o mesmo elenco, o que nos permite acompanhar o crescimento de todos. São imagens quase reais que acompanham em tempo real a vida de Mason (Ellar Coltrane) desde a sua infância  (dos 6 anos) até à sua adolescência (aos 18 anos). O filme resulta numa colagem de “grandes momentos”, os bons e os maus momentos de uma vida, a de Mason, a da sua irmã mais velha (Lorelei Linklater), a da sua mãe lutadora (Patricia Arquette) e a do seu pai ausente (Ethan Hawke).
A narrativa está construída de uma forma muito natural e simples, o que nos cria uma experiência ainda mais realista da vida de Mason. O uso de elementos como o avanço da tecnologia, o vestuário, episódios políticos, a cultura, etc., funcionam muito bem como referências à época em que decorrem os momentos e funcionam para percebemos a forma como o tempo passa de uma cena para outra. “Boyhood” retrata a imagem de uma determinada geração que tem agora a mesma idade que Mason.
Visto as rodagens terem decorrido durante doze anos, está muito bem conseguida, da forma mais natural, o envelhecimento das personagens, quer nos adultos, quer nas crianças. São transformações naturais nos seus corpos e não artifícios da maquilhagem. Este simples pormenor permite que os atores falem do envelhecimento através dos seus próprios corpos.
O primeiro beijo, a namorada, a separação dos pais, a mudança de casa, a nova escola, novos amigos, as brigas com colegas, as saídas à noite, as festas, o primeiro cigarro e a primeira bebida alcoólica, o trabalhar nas férias para ir para uma boa faculdade e finalmente, entrar na faculdade que queríamos e fazer novas amizades. É sempre um ciclo de aprendizagem, de experiências e de aventuras. São estes os principais momentos da vida, os que mais nos marcam claro. Depois de crescidos, esta é uma viagem sem regresso.
É um daqueles filmes que vai certamente marcar muita gente, por abordar questões tão universais e como a própria vida, e a forma como crescemos e como a vivemos. É  impossível o público não se identificar com nenhuma das personagens ou com os momentos da vida ficcionados aqui apresentados. Há sempre algum momento ou elemento que nos remete para a nossa infância. É como se tivéssemos um flashback do nosso passado durante doze anos, o que nos faz pensar na importância da família e dos amigos. No fundo, de todos aqueles que nos rodeiam, pois são eles que nos formam, que nos moldam, que estão presentes nos bons e maus momentos da vida.
Mesmo que por vezes o filme recorra a certos clichés da vida (o que é inevitável), percebemos em quase três horas de filme, que a vida passa num instante e só temos uma oportunidade. De certa forma é uma lição de vida, pelo que o visionamento deste filme deverá ser obrigatório, pelo menos uma vez. Delicada realização e magnífico elenco deste que é um dos melhores filmes do ano.
Tiago Resende, cinema7arte.com/


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