Explicação prévia:
Quando programámos este ciclo "Por detrás do Amor", ainda em Dezembro, marcámos OS MIÚDOS ESTÃO BEM mas posteriormente, com o receio de que, durante 2 meses, pudesse o SBC vir a programá-lo, arranjámos em sua substituição Tamara Drew (filme de menor interesse face ao primeiro). Já no decurso de Fevereiro contactámos a distribuidora Castello Lopes que nos confirmou que o SBC havia desistido de programar este título.
Assim, eis o
Quando programámos este ciclo "Por detrás do Amor", ainda em Dezembro, marcámos OS MIÚDOS ESTÃO BEM mas posteriormente, com o receio de que, durante 2 meses, pudesse o SBC vir a programá-lo, arranjámos em sua substituição Tamara Drew (filme de menor interesse face ao primeiro). Já no decurso de Fevereiro contactámos a distribuidora Castello Lopes que nos confirmou que o SBC havia desistido de programar este título.
Assim, eis o
NOMEADO PARA
Óscar de Melhor Filme (site)
Óscar de Melhor Actriz (Annette Bening)
Óscar de Melhor Actor Secundário (Mark Ruffalo)
Óscar de Melhor Argumento Original (Lisa Cholodenko e Stuart Blumberg)
Afinal, ao contrário do que dizia Tolstoi, as famílias incomuns também não tem nada de especial: Os Miúdos Estão Bem é um retrato doméstico da pós-contemporaneidade.
A premissa de Os Miúdos Estão Bem resume-se a isto: uma família normal enfrenta circunstâncias inusuais. Esta é apenas o alinhamento horizontal de notas musicais, sons e silêncios que constituem a melodia do filme. Pode ser a mesma de tantos outros filmes. Só que depois há um conjunto de nuances, ritmos, arranjos e harmonias que transformam por completo a música . E fizeram do "drama cómico" de Lisa Cholodenko, um dos filmes mais falados do Festival de Sundance 2010 (também vencedor de um prémio em Berlim), a acenar aos Oscars. E essas pequenas grandes nuances são tantas e tão curiosas que se corria o risco de deslavar esta página apinhando-a de enumerações, como monótonas listas de compras. Mas para já, mantemo-nos na metáfora da melodia, porque vem mesmo a calhar, já que o título coincide (por acaso ou talvez não) com a música dos The Who, The Kids Are Alright, do seu primeiro álbum My Generation, de 1965. E é disso justamente que se fala aqui, daquela que ainda é a nossa geração.
Daquela que já consegue olhar um filme de uma família composta por duas mães e dois meios-irmãos adolescentes, concebidos por um anónimo dador de esperma, sem colocar logo à cabeça a questão do lesbianismo. E isso é bom, porque apetece muito mais falar do extraordinário elenco: as maravilhosas, e mais luminosas que nunca, Annette Bening e Jullianne Moore, a interpretarem o mais luminoso casal do cinema dos últimos anos; a filha Mia Wasikowska (a Alice de Tim Burton), e o filho, o estreante Josh Hutcherson... E ainda o intruso nesta família tão (dis)funcional como as outras, que não vai deixar tudo como dantes - o aparecimento do pai biológico, um "cool guy" americano, descontraído dono de um restaurante rústico, que anda de mota, tem namoradas ocasionais e nos seus tempos de estudante doou esperma "porque era fixe" e para ganhar alguns trocos: Mark Ruffalo, talvez no seu mais intenso papel. Não só ambos os miúdos como uma das mães (Julliane Moore, com quem já protagonizara um casal em Ensaio sobre a Cegueira) deixam-se seduzir por ele . O que provoca um abalo sísmico num casamento de longa data. Ou seja a ordem torna-se desordem quando a normalidade (a existência de um pai) acontece. Uma espécie de dessarrumação afetiva, como uma peça de um outro jogo que se vem infiltrar num puzzle já (quase) completo. E esta peça desalinhada descobre, aos 50 anos, que nem lhe desagrada o enquadramento acolhedor de um lar, de uma relação estável, de uns filhos impecáveis, de uma casa formidável nuns subúrbios do sul da Califórnia. E de todo aquele ménage criado, inadvertidamente, num tubo de ensaio.
O que há de mais comovente, vibrante, e até cintilante neste filme é o facto de a realizadora (também ela protagonista de um casamento gay prolongado) e o co-argumentista, Stuart Blumberg (também dador de esperma nos tempos da faculdade) não usarem a singularidade sexual desta família para jogar com os estereótipos e tirar daí os habituais dividendos humorísticos. Neste aspeto, é um filme na linha de Brokeback Mountain, que não se enfia na gaveta dos filmes gay.
Claro que é divertido ver quatro braços estendidos a pedir "abracinho" a dois adolescentes enfadados. Mas esse é um lado ternurento, que faz apenas sorrir, e não rir com os gags e as paródias óbvias do costume. Até porque este é um filme tecido com várias dores. As dores de separação (quando a filha mais velha sai de casa para ir para a faculdade e tem de cortar não um mas dois cordões umbilicais). As dores de amadurecimento do limiar da meia idade, onde todos os três adultos se encontram. As dores da infidelidade e de outras imperfeições humanas. As dores de extenuamento de um matrimónio de longo termo, quando a habituação desgasta e o sexo é rotina. Dores de dantes, dores de agora, dores de sempre, dores de todos. Nesta família tão exclusiva que nos é tão universalmente... familiar. Há sempre algo de absurdo nestas nossas existências humanas. Ou como diz Julliane Moore perto do final: "Se calhar devia ter lido mais romances russos...".
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Ana Margarida de Carvalho, Visão
Um filme sensível que fala de uma família tão (dis)funcional como qualquer outra. Por acaso são duas as mães... ou não só por acaso. (...) Em nenhum momento, Os Miúdos estão bem questiona a viabilidade de um casal homossexual. Encontra-se num estado avançado em termos civilizacionais, em que esse tipo de dúvida nem sequer surge. O casal lésbico é, acima de tudo, um casal, apesar de ter as suas peculiaridades, que para nós poderão parecer exóticas. Por isso, não questiona, mas mostra o dia-a-dia daquela família americana. E em nenhum ponto do conflito, nem mesmo quando os filhos procuram o pai biológico, o dador, levanta esse tipo de questões.
Com elegância e maturidade, o filme não se cola a nenhum dos extremos: não é traçado um perfil desastroso daquela família, próximo da insolvência, mas também não se tenta provar a perfeição daquela família, só para defender a causa. Aquela família é tão disfuncional como outra qualquer. E está em crise aguda. A filha mais velha fez 18 anos e está prestes a sair de casa. O filho, de 15 anos, reúne todas as preocupações da adolescência. As mães atravessam uma crise de meia-idade.
Óscar de Melhor Filme (site)
Óscar de Melhor Actriz (Annette Bening)
Óscar de Melhor Actor Secundário (Mark Ruffalo)
Óscar de Melhor Argumento Original (Lisa Cholodenko e Stuart Blumberg)
Afinal, ao contrário do que dizia Tolstoi, as famílias incomuns também não tem nada de especial: Os Miúdos Estão Bem é um retrato doméstico da pós-contemporaneidade.
A premissa de Os Miúdos Estão Bem resume-se a isto: uma família normal enfrenta circunstâncias inusuais. Esta é apenas o alinhamento horizontal de notas musicais, sons e silêncios que constituem a melodia do filme. Pode ser a mesma de tantos outros filmes. Só que depois há um conjunto de nuances, ritmos, arranjos e harmonias que transformam por completo a música . E fizeram do "drama cómico" de Lisa Cholodenko, um dos filmes mais falados do Festival de Sundance 2010 (também vencedor de um prémio em Berlim), a acenar aos Oscars. E essas pequenas grandes nuances são tantas e tão curiosas que se corria o risco de deslavar esta página apinhando-a de enumerações, como monótonas listas de compras. Mas para já, mantemo-nos na metáfora da melodia, porque vem mesmo a calhar, já que o título coincide (por acaso ou talvez não) com a música dos The Who, The Kids Are Alright, do seu primeiro álbum My Generation, de 1965. E é disso justamente que se fala aqui, daquela que ainda é a nossa geração.
Daquela que já consegue olhar um filme de uma família composta por duas mães e dois meios-irmãos adolescentes, concebidos por um anónimo dador de esperma, sem colocar logo à cabeça a questão do lesbianismo. E isso é bom, porque apetece muito mais falar do extraordinário elenco: as maravilhosas, e mais luminosas que nunca, Annette Bening e Jullianne Moore, a interpretarem o mais luminoso casal do cinema dos últimos anos; a filha Mia Wasikowska (a Alice de Tim Burton), e o filho, o estreante Josh Hutcherson... E ainda o intruso nesta família tão (dis)funcional como as outras, que não vai deixar tudo como dantes - o aparecimento do pai biológico, um "cool guy" americano, descontraído dono de um restaurante rústico, que anda de mota, tem namoradas ocasionais e nos seus tempos de estudante doou esperma "porque era fixe" e para ganhar alguns trocos: Mark Ruffalo, talvez no seu mais intenso papel. Não só ambos os miúdos como uma das mães (Julliane Moore, com quem já protagonizara um casal em Ensaio sobre a Cegueira) deixam-se seduzir por ele . O que provoca um abalo sísmico num casamento de longa data. Ou seja a ordem torna-se desordem quando a normalidade (a existência de um pai) acontece. Uma espécie de dessarrumação afetiva, como uma peça de um outro jogo que se vem infiltrar num puzzle já (quase) completo. E esta peça desalinhada descobre, aos 50 anos, que nem lhe desagrada o enquadramento acolhedor de um lar, de uma relação estável, de uns filhos impecáveis, de uma casa formidável nuns subúrbios do sul da Califórnia. E de todo aquele ménage criado, inadvertidamente, num tubo de ensaio.
O que há de mais comovente, vibrante, e até cintilante neste filme é o facto de a realizadora (também ela protagonista de um casamento gay prolongado) e o co-argumentista, Stuart Blumberg (também dador de esperma nos tempos da faculdade) não usarem a singularidade sexual desta família para jogar com os estereótipos e tirar daí os habituais dividendos humorísticos. Neste aspeto, é um filme na linha de Brokeback Mountain, que não se enfia na gaveta dos filmes gay.
Claro que é divertido ver quatro braços estendidos a pedir "abracinho" a dois adolescentes enfadados. Mas esse é um lado ternurento, que faz apenas sorrir, e não rir com os gags e as paródias óbvias do costume. Até porque este é um filme tecido com várias dores. As dores de separação (quando a filha mais velha sai de casa para ir para a faculdade e tem de cortar não um mas dois cordões umbilicais). As dores de amadurecimento do limiar da meia idade, onde todos os três adultos se encontram. As dores da infidelidade e de outras imperfeições humanas. As dores de extenuamento de um matrimónio de longo termo, quando a habituação desgasta e o sexo é rotina. Dores de dantes, dores de agora, dores de sempre, dores de todos. Nesta família tão exclusiva que nos é tão universalmente... familiar. Há sempre algo de absurdo nestas nossas existências humanas. Ou como diz Julliane Moore perto do final: "Se calhar devia ter lido mais romances russos...".
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Ana Margarida de Carvalho, Visão
Um filme sensível que fala de uma família tão (dis)funcional como qualquer outra. Por acaso são duas as mães... ou não só por acaso. (...) Em nenhum momento, Os Miúdos estão bem questiona a viabilidade de um casal homossexual. Encontra-se num estado avançado em termos civilizacionais, em que esse tipo de dúvida nem sequer surge. O casal lésbico é, acima de tudo, um casal, apesar de ter as suas peculiaridades, que para nós poderão parecer exóticas. Por isso, não questiona, mas mostra o dia-a-dia daquela família americana. E em nenhum ponto do conflito, nem mesmo quando os filhos procuram o pai biológico, o dador, levanta esse tipo de questões.
Com elegância e maturidade, o filme não se cola a nenhum dos extremos: não é traçado um perfil desastroso daquela família, próximo da insolvência, mas também não se tenta provar a perfeição daquela família, só para defender a causa. Aquela família é tão disfuncional como outra qualquer. E está em crise aguda. A filha mais velha fez 18 anos e está prestes a sair de casa. O filho, de 15 anos, reúne todas as preocupações da adolescência. As mães atravessam uma crise de meia-idade.
Tudo se agrava com a entrada em cena do dador, que o filho insiste em conhecer. É uma personagem bem desenhada, que se torna a pessoa certa no momento certo e logo depois a pessoa errada no momento errado.Trata-se de um homem na casa dos quarenta, com ares de galã, sem relações estáveis, que vê ali de repente uma oportunidade para ter uma família, já criada e tudo, sem ter que passar pelas preocupações básicas. Esta vontade intuitiva acaba por se complementar com a fragilidade da personagem de Julianne Moore.
O que mais conta é que o filme consegue tocar nos pontos certos de comoção, torna-se íntimo do público. Tem aquele encanto formal de outras obras do cinema independente norte-americano que abordam as famílias e as suas crises, como A Lula e a Baleia e Little Miss Sunshine. E isto é conseguido através do primor de todos os seus ingredientes. A começar pelo argumento, muito bem construído, com boas personagens e diálogos. E com destaque para as interpretações. Os miúdos, Mia Wasikowska e Josh Hutcherson, são fora de série. O 'pai', Mark Ruffalo, que já tinha contracenado com Julianne Moore em Ensaio sobre a Cegueira, consegue criar uma personagem riquíssima, sem ser excessiva. E as duas mães são perfeitas, sendo que Julianne Moore poderá mesmo ser nomeada para os Óscares por este grande papel. Uma palavra ainda para a fantástica banda sonora, com alguns dos melhores da cena indie.
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Manuel Halpern, Visão
CONTÉM DECLARAÇÕES DA REALIZADORA
Os Miúdos Estão Bem é a nova obra da realizadora americana Lisa Cholodenko, autora de filmes como "Atracção Acidental" (2002), com Christian Bale e Frances McDormand, ou "Cavedweller", adaptação para a televisão em 2004 da obra de Dorothy Allison, com Aidan Quinn e Kyra Sedgwick.
Mas é na televisão que Lisa tem feito mais trabalho, com a realização de alguns episódios da série premiada de Alan Ball "Sete Palmos de Terra", "A Letra L", "Hung" ou "Push, Nevada".
"Os Miúdos Estão Bem" foi escrito também por Lisa e por Stuart Blumberg, ganhou o Urso de Ouro para Melhor Filme no Festival de Berlim deste ano e estreou em Portugal no Estoril Film Festival.
Esta história acaba por ter algumas semelhanças com a própria realizadora. A saber: Lisa Cholenko vive também uma relação feliz com Wendy Melvoin, guitarrista e compositora, ex-membro da antiga banda de Prince, The Revolution, e também ela deu à luz um rapaz gerada através de inseminação artificial, graças à boa vontade de um dador anónimo.
E não só. Não é por acaso que a personagem de Moore (Jules) é uma designer de jardinagem em potência: "Eu e a minha namorada tínhamos comprado uma casa que precisava de algum trabalho exterior. Envolvemo-nos num grande projecto de jardinagem, eu andava a escolher plantas e merdas dessas. Então pensei, "é isso que ela [Jules] vai ser", contou a realizadora à revista "Film Maker". "O nosso objectivo era falar de temas pessoais e muito específicos da nossa vida, através de uma forma mais universal, que fosse acessível a pessoas de qualquer género, idade ou orientação sexual", explicou ao site "ScreenCrave".
"Os Miúdos Estão Bem" foi filmado em 23 dias. Ao contrário do que o título original indica, aqui não há canções dos The Who. Mas há temas dos Vampire Weekend, MGMT, David Bowie e uma incursão pela obra de Joni Mitchell, entre muitos outros. Uma banda sonora escolhida a dedo para uma comédia romântica comercial com uma pitada indie, para os mais alternativos.
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Jornal I
Título Original: The kids are all right
Realização: Lisa Cholodenko
Argumento: Lisa Cholodenko e Stuart Blumberg
Interpretação: Annette Bening, Julianne Moore, Mark Ruffalo, Mia Wasikowska, Josh Hutcherson, Yaya DaCosta
Direcção de Fotografia: Igor Jadue-Lillo
Montagem: Jeffrey M. Werner
Música Carter Burwell
Origem: EUA
Ano de Estreia: 2010
Duração: 106’
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