Dia 26, 21h30, Grande Auditório de Gambelas
Com o apoio da Reitoria da Universidade do Algarve
FILME DO DESASSOSSEGO, de João Botelho
PRESENÇA DO REALIZADOR (mesmo!) e do protagonista CLÁUDIO DA SILVA
Preços: Sócios e Estudantes - 4€ / Restantes casos - 5€
Bilhetes já à venda (sede ao lado da Zara, 2ªf, 3ªf e 4ªf, 10h30-12h30 / 14h30-17h30, e sessões IPJ às 2ªf 21h30)
Às 18h, no Clube Farense, encontro com Richard Zenith e João Botelho. Organização da UAlg. Entrada livre.
Com o apoio da Reitoria da Universidade do Algarve
FILME DO DESASSOSSEGO, de João Botelho
PRESENÇA DO REALIZADOR (mesmo!) e do protagonista CLÁUDIO DA SILVA
Preços: Sócios e Estudantes - 4€ / Restantes casos - 5€
Bilhetes já à venda (sede ao lado da Zara, 2ªf, 3ªf e 4ªf, 10h30-12h30 / 14h30-17h30, e sessões IPJ às 2ªf 21h30)
Às 18h, no Clube Farense, encontro com Richard Zenith e João Botelho. Organização da UAlg. Entrada livre.
O desejo de não desejar
Escreve Pessoa, prefaciador do “Livro do Desassossego”: “Nunca — eu o creio — houve criatura por fora humana que mais complexamente cedesse a sua consciência de si própria”.
Esta cedência da consciência envolve um assombramento visceralmente português (se é que num país ocupado pela pornografia telenovelesca ainda temos a serenidade ou, se for caso disso, a coragem de contemplar os fantasmas da nossa intimidade). É o assombramento de um desejo que transporta a nitidez indizível da morte. Ou ainda: o desejo de não desejar.
Esse é, afinal, o desafio sempre actual, ou melhor, sempre presente de Bernardo Soares: o de renegar qualquer certeza do destino, pensando e escrevendo num universo de tão depurada geometria emocional que, no limite, poderia dispensar a convulsão mágica do desejo. Esse é também o desafio imenso, desassossegado e cru, do filme de João Botelho: como filmar o antidesejo de desejar ser português?
Não por acaso, «Filme do Desassossego» repele a peste do determinismo televisivo. Não, não se trata de evocar um génio da cultura para ilustrar qualquer heroísmo oficial. Não, este não é o retrato de um símbolo do ser português. Desde logo, porque o herói se distingue pela sua fuga a qualquer missão que não caiba na espessura intratável do texto. Depois, porque agonizamos numa avalancha de simbologias que, nas últimas décadas, nos fizeram perder o contacto tanto com a densidade existencial do salazarismo como com as energias que, apesar de tudo, o desmantelaram.
Este é um filme orgulhosamente primitivo, “griffithiano” por método, não por revivalismo. Nele se celebra a crueza original de ser uma imagem e ser um som, essas coisas de que se faz o cinematógrafo, oferecendo-nos passaportes para o não ser que não cabe nos telejornais. “O lema que hoje mais requeiro para definição do meu espírito é o de criador de indiferenças”, Bernardo Soares dixit.
Num avisado axioma, Roland Barthes ensinou-nos que, nisto de cultura, o desejo tende a ser medieval. Talvez isso nos ajude a dizer o que aqui acontece: «Filme do Desassossego» é um glorioso objecto medieval. Tanto pior para a modernidade.
João Lopes, Cinema 2000
Escreve Pessoa, prefaciador do “Livro do Desassossego”: “Nunca — eu o creio — houve criatura por fora humana que mais complexamente cedesse a sua consciência de si própria”.
Esta cedência da consciência envolve um assombramento visceralmente português (se é que num país ocupado pela pornografia telenovelesca ainda temos a serenidade ou, se for caso disso, a coragem de contemplar os fantasmas da nossa intimidade). É o assombramento de um desejo que transporta a nitidez indizível da morte. Ou ainda: o desejo de não desejar.
Esse é, afinal, o desafio sempre actual, ou melhor, sempre presente de Bernardo Soares: o de renegar qualquer certeza do destino, pensando e escrevendo num universo de tão depurada geometria emocional que, no limite, poderia dispensar a convulsão mágica do desejo. Esse é também o desafio imenso, desassossegado e cru, do filme de João Botelho: como filmar o antidesejo de desejar ser português?
Não por acaso, «Filme do Desassossego» repele a peste do determinismo televisivo. Não, não se trata de evocar um génio da cultura para ilustrar qualquer heroísmo oficial. Não, este não é o retrato de um símbolo do ser português. Desde logo, porque o herói se distingue pela sua fuga a qualquer missão que não caiba na espessura intratável do texto. Depois, porque agonizamos numa avalancha de simbologias que, nas últimas décadas, nos fizeram perder o contacto tanto com a densidade existencial do salazarismo como com as energias que, apesar de tudo, o desmantelaram.
Este é um filme orgulhosamente primitivo, “griffithiano” por método, não por revivalismo. Nele se celebra a crueza original de ser uma imagem e ser um som, essas coisas de que se faz o cinematógrafo, oferecendo-nos passaportes para o não ser que não cabe nos telejornais. “O lema que hoje mais requeiro para definição do meu espírito é o de criador de indiferenças”, Bernardo Soares dixit.
Num avisado axioma, Roland Barthes ensinou-nos que, nisto de cultura, o desejo tende a ser medieval. Talvez isso nos ajude a dizer o que aqui acontece: «Filme do Desassossego» é um glorioso objecto medieval. Tanto pior para a modernidade.
João Lopes, Cinema 2000
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