DIA 18 DE DEZEMBRO "GALINHA COM AMEIXAS", Marjane Satrapi e Vincent Paronnaud, França/Bélgica, 2011, 91’, M/12
FICHA TÉCNICA
Título
Original: Poulet aux Prunes
Realização:
Marjane Satrapi e Vincent Paronnaud
Argumento:
Marjane Satrapi e Vincent Paronnaud, a partir da
banda-desenhada «Poulet aux prunes» de Marjane Satrapi
Fotografia:
Christophe Beaucarne
Montagem: Stéphane Roche
Música original: Olivier Bernet
Interpretação: Mathieu Amalric, Maria de Medeiros, Golshifteh Farahani, Eduard Baer,
Música original: Olivier Bernet
Interpretação: Mathieu Amalric, Maria de Medeiros, Golshifteh Farahani, Eduard Baer,
Origem:
França/Bélgica
Ano:
2011
Duração:
91’
SINOPSE
Teerão, 1958. Nasser Ali Khan, o mais famoso violinista,
perde o seu violino, partido durante uma discussão. Incapaz de encontrar outro que
o possa substituir, Nasser Ali percebe que a vida sem música é intolerável.
Fecha-se no quarto, sem sair da cama e os seus sonhos fazem-no regressar à sua
infância ou transportam-no para o futuro dos seus filhos. Durante essa semana,
à medida que as peças da sua história se encaixam, descobrimos o seu segredo e
a razão que o leva a desistir da vida em nome da música e do amor.
CRÍTICAS
Persépolis"
não foi um fogacho, Marjane Satrapi e Vincent Paronnaud têm um olhar de
cineastas e "Galinha com Ameixas" consegue resgatar todas as
fraquezas que possa parecer ter.
Não é preciso muito para perceber que Marjane Satrapi, a aclamadíssima artista gráfica de Persépolis, e o seu cúmplice Vincent Paronnaud têm um olhar de cineasta. É ver como Galinha com Ameixas, segunda longa-metragem da dupla, não podia estar mais longe da primeira, substituindo a animação de Persépolis pela imagem real com actores de nome (Mathieu Amalric, Chiara Mastroianni, Isabella Rossellini, Maria de Medeiros); mas são o seu olhar e a sua abordagem que continuam a vir ao de cima e, sobretudo, esse olhar não se perde na transferência de formatos, ganhando antes um fôlego cinematográfico que não seria evidente.
Não é preciso muito para perceber que Marjane Satrapi, a aclamadíssima artista gráfica de Persépolis, e o seu cúmplice Vincent Paronnaud têm um olhar de cineasta. É ver como Galinha com Ameixas, segunda longa-metragem da dupla, não podia estar mais longe da primeira, substituindo a animação de Persépolis pela imagem real com actores de nome (Mathieu Amalric, Chiara Mastroianni, Isabella Rossellini, Maria de Medeiros); mas são o seu olhar e a sua abordagem que continuam a vir ao de cima e, sobretudo, esse olhar não se perde na transferência de formatos, ganhando antes um fôlego cinematográfico que não seria evidente.
Sim, Galinha com Ameixas é de novo uma adaptação ao cinema
uma novela gráfica de Marjane (já não narrando a sua própria experiência no
Irão pós-revolução, antes inspirando-se na história de um tio seu); sim, a
dupla continua a trabalhar na estética do conto persa, o fumo do cigarro continua
a ser um elemento visual importante (razão mais que suficiente para os
fumadores continuarem a ter esperança). Sim, na passagem da BD para a imagem
real, Galinha com Ameixas escorrega pontualmente para um tom satírico um pouco
forçado, para um formalismo um pouco carregado, para uma sensação de
inconsequência tacteante (nem sempre o que resulta no papel funciona em grande
écrã). Mas, ao mesmo tempo, sente-se uma vontade de correr riscos, de não ficar
quieto nem de repetir o que já foi feito, que fica muito bem a Marjane e
Vincent. E sente-se igualmente um fôlego romanesco, de um romantismo
grandiosamente fora de moda, que resgata quaisquer fraquezas que o filme possa
ter.
Lentamente desenrolando os pergaminhos que, na Teerão de
finais dos anos 1950, levam um músico aclamado mundialmente a suicidar-se, num
duplo movimento que vê a história avançar ao mesmo tempo em direcção ao futuro
e de regresso ao passado, Marjane e Vincent vão revelando aos poucos os motivos
para Nasser Ali desejar a morte tão ardentemente, numa série de encadeados
desequilibrados mas impecavelmente sinalizados, transportados pela performance
sublime de Mathieu Amalric, actor maior que parece não ser capaz de dar um
passo em falso. Viremos a saber que, como diz o mestre de Nasser Ali, é através
da arte que compreendemos a vida, e que o instrumento apenas é um modo de
deixar a luz entrar e iluminar o que se vive.
Está-se a falar de música, sim, mas também de cinema e de
muitas outras coisas. E quando Galinha com Ameixas atinge os seus últimos 15
minutos, quando a última peça do quebra-cabeças é colocada, o quadro ganha de
repente todo o seu sentido e o filme ganha um impacto emocional insuspeito que
justifica e compensa num instante todos os escorregões ou momentos desastrados
e confirma que está aqui um olhar de cinema, um gosto de cineasta, a trabalhar.
Persépolis não foi um fogacho, há cinema em Marjane Satrapi e Vincent
Paronnaud, e há muito a recomendar nesta Galinha com Ameixas que não é apenas
exótica mas também sedutora.
Jorge Mourinha, Ípsilon