Verde e amarelo a preto e branco

(Pensa a Baleia em Vidas Sêcas, de Graciliano Ramos: "Acordaria feliz, num mundo cheio de preás. ... O mundo ficaria todo cheio de preás, gordos, enormes.")

Durante o último mês tenho tentado preencher um vazio na retina dos meus olhos. Começava a ser um buraco demasiado largo e, no fim, arriscava cegar para tudo o que já vi. Não comecei por este, mas Vidas Sêcas, de Nelson Pereira dos Santos, é um dos filmes que com maior energia se fixou em mim. Por motivos diferentes e todos marcantes. O filme foi produzido por Luiz Carlos Barreto (LCB). Assim dito, para alguém que pouco ou nada sabia de cinema brasileiro até há, portanto, uns trinta dias, não significava nada. Mas se se quiser escolher um caminho para se adentrar na filmografia brasileira dos últimos quarenta anos, este nome levará a uma das estradas mais largas.
Além de produtor, neste filme LCB fez também a fotografia - foi como fotógrafo que começou e por aí foi também que me chamou a atenção antes de mais nada. Se não houvesse movimento naquelas imagens (em certas sequências, quase não há), o prazer que tirei de ver o filme seria idêntico ao que teria numa exposição da sua obra fotográfica, tenho a certeza. O realizador foi Nelson Pereira dos Santos, outro caminho amplo para o cinema brasileiro.
Não vejo os filmes só por ou para saber quem os fez, quem os imaginou (embora sabê-lo me ajude a homenageá-los, quando se trata de gente de olhar belo e cru). Neste, poderia não saber mais nada, deixar apenas que as imagens se fossem fixando, ajudadas pelo barulho das cigarras, contínuo e mecânico, pelo rugido seco, seco, do capim sem água por baixo dos pés mal calçados, ou do arfar da cachorra Baleia. Poderia esperar o muito tempo que se espera neste filme por alguma palavra rara (e como é estranho e bonito ver quase sem palavras um filme que se fez de um livro, cheio de tantas), esperar e amar a espera. No fim, a única coisa que me falhou compreender foi como é que, dum país que fala a mesma língua que eu, só agora começo a ver os filmes.

(Se ampliarem a imagem, lá bem no centrinho está ela, a cachorra Baleia. A olhar para a gente.)

e há ainda cinema na mina de sal gema

a começar dia 29 de setembro com o seguinte programa:

Dia 29 Setembro
CABINE TELEFÓNICA, Joel Schumacher, EUA, 2002, 81’

Dia 6 Outubro
SALA DE PÂNICO, de David Fincher, EUA, 2002, 112’

Dia 13 Outubro
UNDERGROUND – ERA UMA VEZ UM PAÍS, de Emir Kusturica, Sérvia, 1995, 167’

Dia 20 Outubro
A NOITE DOS MORTOS VIVOS, de George Romero, EUA, 1968, 96’

Projecção de 4 filmes divididos em 4 matinés numa das galerias da mina a 230 metros de profundidade, sob a temática da “clausura”. A exibição dos filmes será inteiramente gratuita, mas limitada a um total de 40 inscrições por sessão.

Para formalizar a sua inscrição deverá contactar a Casa da Cultura de Loulé através da morada de e-mail ccloule@iol.pt indicando a sessão pretendida, o nome e o contacto telefónico; a falta de qualquer destes itens poderá inviabilizar a inscrição.

Todas as sessões decorrem aos Sábados e todos os espectadores terão que estar junto às instalações da Mina de Sal Gema (Rua Quinta de Betunes) às 15 horas.


a organização é dos nossos colegas da casa da cultura de loulé (como se vê) e nossa (quanto ao ciclo) e tem, naturalmente, a colaboração da cuf.

cinema nos subterrâneos nunca tinhamos dado!! o ccf é assim: leva-nos às alturas até debaixo de terra...

we're back! (actualizado no dia 17)

como se nota pela musiquinha ao lado!

cheios de força por essa galáxia adiante!

a ver se encontramos algures nela o subsídio da câmara que nos permitirá sobreviver!

no entrementes, arranjamos óptima programação muuuuuuuito baratinha!

(oh inclemência!, oh martírio!)

se repararem, são 9 sessões entre dias 19 e 3 de outubro e só uma é paga. ah gente generosa que somos nós, hein???

(facto que ciclo-ciclo nosso é só um mini-um, os outros dois são colaborações)


SETEMBRO 2007

CICLO PARA SEMPRE

Cinatrium, Sala 2

Dia 19, 18h, entrada livre
CENAS DA VIDA CONJUGAL, Ingmar Bergman, Suécia, 1973, 167’

Dia 19, 22h, entrada livre
SARABAND, Ingmar Bergman, Suécia, 2005, 120’

Dia 26, 22h, ENTRADA PAGA QUE SOMOS UNS EXPLORADORES
PROFISSÃO: REPÓRTER, Michelangelo Antonioni, Itália, 1975, 126’



CICLO SERRALVES - CINEMA CONTEMPORÂNEO

Teatro Lethes, 22h, entrada livre

Dia 22
KITSUNE (O ESPÍRITO DA RAPOSA), João Penalva, 2001, projecção de vídeo, cor, som, 55'28'' - em duas versões (português e inglês), num total de 2 horas de sessão (aprox.)

Dia 23
A STUDY OF THE RELATIONSHIP BETWEEN INNER AND OUTERSPACE, David Lamelas, 1969, 16mm, p/b, som, 24'
WAVELENGHT, Michael Snow , 1967, 16 mm, cor, som óptico, 45'
SPIRAL JETTY, Robert Smithson, 1970, 16mm, cor, som, 35
'

Organização: Museu de Serralves / Câmara Municipal de Faro


CICLO SEMANA DO MAR

Cinatrium, entrada livre

Dia 27, 18h45
A VIDA SECRETA DAS PALAVRAS, Isabel Coixet, Espanha, 2005, 115'

Dia 29, 18h45
O VELHO E O MAR, Alexander Petrov, Rússia, 1999, 22', animação
PRAIA DA LOTA, Sofia Trincão e Óscar Clemente, Portugal/Espanha, 2001, 30', documentário, com a presença da realizadora

Dia 30, 16h
O PIRATA DAS CARAÍBAS: A MALDIÇÃO DE BLACK PEARL, Gore Verbinski, EUA, 2003, 143’

Dia 1, 18h45
MARIA DO MAR, Leitão de Barros, Portugal, 1930, 70’ filme mudo musicado

Organização: Universidade do Algarve

(tanta trabalheira pro site, tanta trabalheira pra barrinha ao lado! oh inclemência, oh martírio!!)


ah! e ainda sendo que

estamos também a colaborar com a câmara municipal de são brás (continuamos, melhor dizendo) nas sessões de cinema que eles promovem, também com entrada grátis, no cine-teatro local, aos domingos pelas 16h30.

Começa amanhã, dia 16, o ciclo Irmãos Marx, com Animal Crackers, por Breton (foi ele, não foi Mirian?) considerado um primor do cinema surrealista. Imperdível! Veja a programação aqui.

Toca a acordar! (Ou, onde é que andamos?)


Louis Skorecki, entrevistado na Les Inrockuptibles, responde assim a uma pergunta que, desde logo, pede que se discuta:

- Pourquoi les films sont de moins en moins bons selon toi ?
- Les cinéastes font les films que les gens attendent d’eux. Donc si les films sont mauvais c’est que les cinéphiles sont mauvais. Ça c’est un truc que j’ai mis quarante ans à pouvoir dire sous une forme aussi simple. Je le crois profondément : les films sont mauvais si les spectateurs sont mauvais. Je me souviens d’une projection d’un film de ce type qui a fait un film un peu à la mode sur deux junkies, c’était adapté de Selby… Darren Aronofsky ! J’avais vu ça au MK2 Quai de seine. Dans la salle, il y avait cinquante couples et c’était cinquante fois le même. Comment veux-tu faire un bon film après ça ! C’est très facile de voir des films aujourd’hui. Autour de moi, il y a des gens qui ont à peu près le même salaire, qui disent ne pas acheter le câble parce que c’est cher. Mais ils vont voir des nouveautés au cinéma, mangent au restaurant, généralement des trucs dégueulasses. Ce sont ces gens qui font que les films sont mauvais. Moi je vois de moins en moins de films au cinéma, j’en vois un ou deux ou trois par an. Et je ne me force pas à ne pas en voir. Mais même chez moi, je ne regarde pas de DVD. A la télé je préfère le direct, la téléréalité, les séries aussi. Même si les séries m’intéressent aussi moins qu’avant, ça reste quand même plus vivant que le cinéma.

Da poesia de Fellini

(ontem me chegou pelo correio um livro do qual ainda não consegui me separar. É de um escritor brasileiro chamado Mario Quintana (1906-1994). Ele tece comentários um pouco sobre tudo em seu Caderno H: livro de poesia? de crônicas? de aforismos? De tudo, talvez. E nele encontrei este texto sobre Fellini e não resisti a transcrevê-lo num post.)

"Sei de pessoas que julgaram artificial o 8 1/2, de Fellini, essa obra-prima do barroquismo. Elas é que devem ser artificiais, porque nossa alma é assim como ali está, com suas idades sucessivas convivendo, o acontecido e o imaginado tendo ambos o mesmo poder traumático e o mesmo pé de realidade. Parece-te que estou a falar de poesia?
(...) Na poesia há muito já acontecia assim, como na montagem de imagens aparentemente heteróclitas e anacrônicas de Salomé de Apollinaire e que, no entanto, serviam para formar a atmosfera dançante, luxuosa, versátil e aérea daquele poema. E foi preciso quase cem anos para que o cinema, como no 8 1/2 de Fellini, se integrasse também na poesia. Em resumo: não o desprezo da lógica, mas a aceitação da lógica imagista - e que, como todo modernismo, é tão velho como o mundo, porque usa apenas a linguagem dos sonhos e das histórias de fadas."

Get me a ticket to...

Moscovo, Paris, Londres, Turim, Tânger, Madrid, Nova Iorque, what the heck!... Desde que possa sentar-me num cinema, de frente para um écran gigantesco, e veja filmes de acção como este, tanto se me dá. The Bourne Ultimatum tem apenas dois defeitos, e nem sequer são narrativos. Há ali um bocadinho em que descamba para o lamechas, quando o tipinho, depois de descobrir que é matador a soldo, e tal, confronta outro que o vinha assassinar, com o esperado "já pensaste bem no que nos transformaram?" Bullshit, era escusado. O outro é a cena final, dentro de água, mas não adianto. Está mal, full stop. De resto, venham mais quatrocentos e quinze ultimatos, saltos de janelas com vidros partidos, tiros de carros em andamento, apartamentos destruídos pelos polícias, mesas de café insuspeitas e gares perfeitas, cheias e anonimáveis, mortos por inabilidade e inanidades afins. Muitos, muitos mais filmes noir do nosso tempo, sem fito ou intuito, só rostos perdidos nos cenários urbanos. Perdidos por dentro.

Ensinar com técnicas de imagem animada (prendinha para todos os professores)

Trata-se de um Guia acessível na internet, ainda em língua inglesa, feito para professores, de modo a permitir a exploração e apropriação das especificidades tecnológicas e comunicativas das técnicas de imagem animada e a sua utilização na sala de aula.
Está disponível em Guia e tem sete partes: ‘Welcome’, ‘Start’, ‘How to teach’, ‘Make a movie’, ‘Technical set-up’, ‘Techniques e ‘History’.
O professor poderá encontrar informações para, passo a passo, ensinar usando a metodologia necessária à produção de um filme de animação com a ajuda de computadores e câmaras vídeo: como criar uma história, como estruturar um guião, como animar usando técnicas diferentes e como fazer a edição final. Existem instruções para a instalação do equipamento mínimo necessário, escolher as aplicações informáticas mais adequadas entre as disponíveis (em 'open source', isto é, grátis na internet ou de raiz no seu computador) e como gravar e usar uma banda sonora. Poderá consultar, ainda, uma introdução breve à História da Animação. Encontrará, sobretudo, exemplos de planificações de processos pedagógicos elaboradas sobre a exploração destes aspectos.
Este Guia é o resultado de um trabalho de investigação realizado - entre Outubro de 2005 e Agosto de 2007 - por um grupo de especialistas europeus provenientes das seguintes instituições: The University of the West of England, Bristol (Reino Unido); Ciclope Filmes, Porto (Portugal); 9Zeros, Barcelona (Espanha); Kinobuss, Tallinn, (Estónia); School of Education, University of Aarhus, Copenhagen (Dinamarca); e coordenado pelo Animation Workshop, CVU Midt-Vest (Dinamarca).
O projecto foi financiado pela Comunidade Europeia através do programa Leonardo Da Vinci.

Esta imagem faz parte do pequeno filme que resultou do 2º teste do Guia, efectuado em Outubro de 2006, com a Professora Maria José Ramalho e as 20 crianças que, com ela, frequentaram o 1º ano do 1º ciclo do ensino básico da Escola do Alto de Rodes, em Faro, assistidas pela aluna Inês Mendes da Escola Superior de Educação.