OUTRA FORMA DE LUTA, João Pinto Nogueira | 26 Maio | IPDJ | 21h30 | PRESENÇA DO REALIZADOR



OUTRA FORMA DE LUTA
João Pinto Nogueira
Portugal, 2014, 80’, M/12

PRESENÇA DO REALIZADOR

Realização: João Pinto Nogueira
Argumento: João Pinto Nogueira
Fotografia: Inês Carvalho
Montagem: Rita Palma
Com: Francisco Nascimento, Jorge Siva, Rafael Freire, Dina Félix da Costa
Origem: Portugal
Ano: 2014
Duração 80’









CRÍTICAS

Outra forma de documentário
Uma biografia em formato de questionário. A vida e percurso de Carlos Antunes, antigo líder das Brigadas Revolucionárias dava um thriller. Nas mãos de João Pinto Nogueira deu um estimável documentário que se assume como um ensaio de um desafio que o escritor Nuno Bragança propôs em 1985 ao amigo: um questionário com 13 perguntas. O filme recria com ficção num palco alguns dos momentos marcantes da atividade clandestina entre os dois amigos comunistas, embora haja também muitas entrevistas.
Astutamente "tomado" pela graça literária de Bragança, Outra Forma de Luta é um compêndio de como o cinema documental deve expor teorias e factos.
Tecnicamente é limitado, mas a sua boa vontade compensa tudo. E nem sempre é assim...
Nos momentos "teatrais", Francisco Nascimento é mais do que competente como Carlos Antunes...
Rui Pedro Tendinha, dn.pt


Em 2008, quase no fim de “U Omãi qe Dava Pulus” (o documentário que João Pinto Nogueira fez sobre o escritor Nuno Bragança), Carlos Antunes narrava o peculiar questionário que Nuno Bragança lhe entregara em fevereiro de 1985 oe onde, praticamente, toda a vida e toda a esperança se indagavam. Antunes não chegou a responder a esse inquérito, o escritor morreu poucos dias volvidos – mas guardou as folhas com as perguntas manuscritas. Responderá agoram 30 anos depois, neste filme – e é toda a ligação entre os dois que ganha uma nova luz pública e a história das Brigadas Revolucionárias (onde ambos militaram) que tem uma particular atenção. Embora sequela óbvia de “U Omãi qe Dava Pulus”, este novo filme não é centrado em Nuno Bragança, mas em Carlos Antunes. E é com ele, com a sua narrativa, com a sua espantosa coloquialidade que o filme e o espectador se enovelam, ao ponto de as passagens teatrais (a partir de fragmentos do romance “Square Tolstoi”) parecem supérfluas excrescências.
Jorge Leitão Ramos, Expresso, 18/4/15

MAMÃ, Xavier Dolan | 19 Maio | IPDJ | 21h30



MAMÃ
Xavier Dolan, Canadá, 2014, 134’, M/14

FICHA TÉCNICA
Título Original: Mommy
Realização, Argumento e Montagem: Xavier Dolan
Fotografia: André Turpin
Música: Noia
Interpretação: Anne Dorval, Antoine-Olivier Pilon, Suzanne Clément
Origem: Canadá
Ano: 2014
Duração: 134’

Festivais e Prémios
Festival de Cannes - Prémio do Júri




NOTA DO REALIZADOR
Desde o meu primeiro filme, falei muito de amor. Falei da adolescência, sequestro e transsexualidade. Falei de Jackson Pollock e dos anos 90, de alienação e homofobia. Os colégios internos, a palavra altamente franco-canadiana “especial”, vacas leiteiras, a cristalização de Stendhal e o Síndrome de Estocolmo. Já falei com muito calão e também com muitos palavrões. Já falei em Inglês, e de vez em quando, também disse muitos disparates, demasiadas vezes.
Porque essa é a questão quando “falamos” de coisas, creio eu, é que há quase sempre o risco inevitável de dizer disparates. E por isso decidi falar só daquilo que sei, ou que era – mais ou menos – próximo de mim. Temas que eu julgava conhecer bastante bem ou pelo menos suficientemente, pois eu conhecia a minha própria diferença e o subúrbio onde fui criado. Ou porque sabia como era vasto o meu medo dos outros, e ainda é. Porque sabia as mentiras que contamos a nós mesmos, quando vivemos em segredo, ou o amor inútil que continuamos teimosamente a dar aos ladrões do tempo. Conheço suficientemente estas coisas para querer até falar delas.
Mas se há tema, um apenas, sobre o qual sei mais do que qualquer outro, um tema que incondicionalmente me inspira, e que au adoro acima de tudo, seria certamente a minha mãe. E quando digo a minha mãe, creio que me refiro à MÃE em geral, à figura que ela representa. Porque é a ela que eu volto sempre. É ela que eu quero ver vencer a batalha, é para ela que quero inventar problemas, para que ela tenha o mérito de os resolver a todos, é através dela que me coloco questões, é ela que quero ouvir gritar bem alto quando não dissemos nada. É ela que quero que esteja certa quando nós estávamos errados, é ela, haja o que houver, que terá a última palavra.
Na época de J’AI TUÉ MA MÈRE, sentia que queria castigar a minha mãe. Apenas cinco anos se passaram desde então e acredito que, através de MAMÃ, agora procuro a vingança dela. Não perguntem.
Xavier Dolan, maio 2014

CRÍTICA
Chegou às salas Mommy, o filme que valeu a Xavier Dolan o Prémio do Júri de Cannes: um título para (re)descobrirmos um jovem e singular criador.
Perante o impacto da obra de Xavier Dolan, cineasta canadiano nascido em Montreal a 20 de Março de 1989, apetece reescrever um velho adágio sobre os méritos profissionais da antiguidade, proclamando agora: a juventude não é um posto... O mínimo que se pode dizer de Dolan é que ninguém ficará indiferente ao facto de, apenas com 25 anos, ele ter realizado um filme como Mamã, colocando em cena de forma tão dramática, e também tão irónica, os eternos conflitos de gerações.
O filme valeu mesmo a Dolan um dos prémios mais saborosos de uma carreira curta, mas já pontuada por diversas distinções. Assim, no passado mês de Maio, no Festival de Cannes, Mamã recebeu o Prémio do Júri, ex-aequo com o mais recente trabalho de Jean-Luc Godard, Adeus à Linguagem. Presidido pela cineasta neozelandesa Jane Campion, o júri aproximava, assim, num mesmo gesto de reconhecimento e consagração, o mais jovem e o mais veterano dos autores presentes no certame (Godard completou 84 anos no dia 3 de Dezembro).
Aliás, importa esclarecer que não se estava perante a revelação de um novo cineasta. Nada disso: Dolan assinou a sua primeira longa-metragem, Como Matei a Minha Mãe, em 2009, portanto com 20 anos. Depois disso, já realizou mais três títulos: Amores Imaginários  (2010), Laurence para Sempre  (2012) e Tom na Quinta  (2013), em todas assumindo também as responsabilidades de escrita de argumento, em três deles interpretando também uma das personagens principais (a excepção é Laurence para Sempre, protagonizado por Melvil Poupaud).
No caso de Mamã, o nome de Dolan também não aparece na ficha dos actores. É Antoine Olivier Pilon, de 17 anos (tinha 16 durante a rodagem), que surge na linha da frente, assumindo a personagem quase burlesca, mas marcada por muitas componentes dramáticas, de Steve Després, um rapaz com evidentes problemas de integração familiar e social, não poucas vezes derivando para comportamentos violentos. No núcleo do filme está, precisamente, a relação com a mãe, Diane Després (Anne Dorval), viúva, com crescentes dificuldades para lidar com o filho, ao mesmo tempo que tenta manter o equilíbrio financeiro do lar.
Estão reunidas, assim, as componentes necessárias (e mais que suficientes...) para um psicodrama com tanto de intimista como de perturbante. E talvez se possa dizer que, até certo ponto, o filme é isso mesmo, encenando as atribulações de uma paisagem afectiva marcada por muitos momentos de convulsão e, aqui e ali, breves fogachos de apaziguamento e intensa ternura. De qualquer modo, e de acordo com uma lógica muito enraizada nas narrativas de Dolan, tudo pode mudar com a emergência de uma personagem inesperada. Neste caso, é Kyla (Suzanne Clément), a vizinha de Diane e Steve, que surge como um insólito e paradoxal “anjo da guarda”, de alguma maneira levando mãe e filho a reavaliar os seus modos de relação. 

Dolan faz retratos do mundo dos afectos em que, no limite, todos são conduzidos a essa reavaliação do seu lugar familiar e simbólico, social ou sexual. No filme anterior, Tom na Quinta, interpretava o Tom do título que, ao comparecer no funeral de um outro jovem, compreendia que toda a família ignorava a sua relação amorosa com o defunto. Agora, em Mamã, Dolan “força” ainda mais os limites tradicionais do melodrama através de uma história marcada por componentes psicológicas muito particulares, mas que nos confronta com uma interrogação muito mais abrangente, por certo ligada ao “progresso” dos nossos usos e costumes. A saber: que é feito dos valores do espaço familiar tradicional? Ou ainda: nas nossas sociedades de aceleração de contactos e relações, como comunicam (ou não) as pessoas de diferentes gerações?
E se o melodrama pressupõe uma aliança entre drama e música, então importa acrescentar que Dolan é também um criador que revaloriza as componentes musicais da narrativa cinematográfica, em particular o uso de canções muito populares. Em Os Amantes Imaginários recuperava, por exemplo, o lendário Bang Bang, interpretado por Dalida. Agora, na banda sonora de Mamã, escutamos, entre outros, Dido (White Flag), Oasis (Wonderwall) e Lana Del Rey (Born to Die).
Quando nos sentimos tocados por um filme, gostamos de partilhar com os outros aquilo que, precisamente, nele mobilizou as nossas emoções e pensamentos. Mas, por vezes, ficamos também limitados por um sentimento de prudência, porventura de pudor. Até onde “revelar” aquilo que, afinal, os outros têm o direito de descobrir no primeiro grau, sem qualquer informação prévia? Digamos que é um pouco como quando revemos A Leste do Paraíso (1955), de Elia Kazan, e deparamos com o genial aproveitamento da largura do CinemaScope, apetecendo sublinhar: reparem como Kazan filma James Dean, tirando o máximo partido de um formato que, na altura, era uma novidade.
Assim, gostaria de falar ao leitor do modo como Xavier Dolan concebe, não apenas as imagens do seu filme Mamã mas também, precisamente, o modo como trata o respectivo formato... Ao mesmo tempo, sinto que se for demasiado explícito, estarei a roubar-lhe a possibilidade de ver/sentir a proposta de Dolan, não em função da tal informação prévia, mas apenas através do filme.
Direi, então, que não se trata de uma questão banalmente formal, muito menos formalista. Nada disso: no cinema de Dolan — e, em particular, neste belíssimo Mamã — todos os elementos figurativos, cénicos ou simbólicos são importantes para a relação que ele estabelece com as personagens e, por extensão, com o labor específico dos actores. Neste inusitado triângulo amistoso — a mãe, o filho e a vizinha —, tudo acontece à flor da pele, revalorizando um realismo dos corpos que, convenhamos, não é a lei dominante no cinema mais poderoso (povoado de “super-heróis” com corpos mais ou menos mecanizados) nem na televisão mais corrente (esgotada em formatos de patético determinismo psicológico). Dolan é um paciente e subtil agrimensor dos afectos.
João Lopeshttp://sound--vision.blogspot.pt

O PEQUENO QUINQUIN | 12 Maio | IPDJ | 21h30

O PEQUENO QUINQUIN
Bruno Dumont, França, 2014, 197’, M/12

FESTIVAIS E PRÉMIOS
Quinzena dos Realizadores – Festival de Cannes
Lisbon & Estoril Film Festival – Competição
Mostra de São Paulo – Prémio da Crítica – Menção Especial
Toronto International Film Festival – Selecção Oficial

FICHA TÉCNICA
Título Original: P'tit Quinquin
Realização e Argumento: Bruno Dumont
Fotografia - Guillaume Deffontaines
Interpretação: Alane Delhaye, Lucy Caron, Bernard Pruvost, Philippe Jore, Philippe Peuvion, Lisa Hartmann, Julien Bodard, Corentin Carpentier
Origem: França
Ano: 2014
Duração: 197’




CRÍTICAS
Se David Lynch tivesse situado o seu “Twin Peaks” na província francesa, o resultado teria sido, provavelmente, algo como “O Pequeno Quinquin”, de Bruno Dumont. Facto: à primeira vista, pouco religa entre si o surrealismo de Lynch e o naturalismo de Dumont (sempre preocupado com a relação entre a natureza e a violência, a loucura e a graça).
Porém, numa ótica temática, os dois cineastas partilham uma obsessão comum pela questão do mal, explorando (cada um a seu modo) o conjunto de forças subterrâneas que corrompem os espaços e os corpos. Pois bem: é justamente o desejo de auscultar o coração do mal que rege a ação de “O Pequeno Quinquin”. O que temos aqui? Uma minissérie de televisão em quatro episódios (cada um com cerca de 50 minutos), que se instala numa aldeia costeira do norte de França, para seguir os passos da personagem do título: uma criança na casa dos 12 que, nas férias de verão, passa os dias a brincar na rua com os amigos. É pelos seus olhos (incrustados num rosto bruto) que assistimos à descoberta do cadáver da primeira vítima de uma série de homicídios que, apesar do seu carácter macabro (corpos retalhados, devorados por animais...), parecem deixar indiferentes os habitantes da aldeia. Os crimes, esses, serão investigados por um duo de polícias ineptos (um velho capitão desgrenhado e um tenente com dentes podres) que, a julgar pela forma como repetem as verdades de La Palice ditas pelo outro, são uma espécie de versão extravagante do Dupond e Dupont de Hergé.
 O que se segue é um procedural que nunca sai do mesmo sítio, mas que possibilita a composição — em paralelo — do retrato de uma comunidade rural que se alheia do horror que a envolve. Ora, neste quadro, a primeira coisa notável é o modo como Dumont constrói um mundo às avessas, apoiando-se, para isso, numa galeria de figuras (interpretadas por um brilhante leque de não-atores) cujas palavras nada dizem e cujos gestos estão sempre fora de tom. Prova da natureza disfuncional deste mundo é a genial sequência do funeral, onde a gravitas da situação será dinamitada — a golpes de humor negro — por uma sucessão de episódios caricatos (o organista virtuoso que não para de tocar, a adolescente que canta em atrozes falsetes...). 
Mas, sobre esta tela burlesca, Dumont formulará uma questão da maior importância, a saber: quando nasce o mal? Ou melhor: a partir de que ponto a violência corriqueira das personagens (a perseguição aos rapazes forasteiros levada a cabo por Quinquin e os amigos) pode ser vista como o prelúdio do mal radical que vem contaminar a aldeia? De facto, o que — ontem como hoje — Dumont quer dar a pensar é a naturalidade de uma violência latente que ameaça explodir a todo o instante e que desfigura os corpos que ousam resistir-lhe (vejam-se os espasmos que atravessam o rosto do polícia). É por isso que a paisagem (os descampados que ladeiam a aldeia) está sempre presente em fundo, servindo como polo de um jogo de espelhos entre a brutalidade da natureza objetiva e a brutalidade da natureza subjetiva — dominada por pulsões que arriscam mergulhar as personagens na loucura, tornando-as apenas numa parte integrante do décor (como acontece com o tio demente do protagonista). Digamos pois que, de pequeno, este filme tem somente o adjetivo do seu título.

Vasco Baptista Marques, Expresso, 14/2/15



Do realismo ao delírio burlesco
Eis um belíssimo exemplo de colaboração cinema/televisão: concebido como mini-série televisiva, "O Pequeno Quinquin" é também uma longa-metragem de cinema — a tradição do realismo francês é retomada e reconvertida num delicioso registo de comédia.
A história de Quinquin (Alane Delhaye) e da sua namorada Ève (Lucy Caron) tem qualquer coisa de visceralmente romântico: ele está loucamente apaixonado por ela e, durante as férias, dão grandes passeios de bicicleta... Em todo o caso, o filme "O Pequeno Quinquin" é menos uma celebração romântica e mais um mergulho nas vidas esquecidas de uma pequena povoação da zona de Pas-de-Calais, no norte de França. Drama, então? Não, antes uma insólita e saborosa comédia!
É verdade: o realizador Bruno Dumont — que conhecemos através de títulos como "A Humanidade" (1999), "Hadewijch" (2009) ou "Camille Claudel 1915" (2013) — mantém-se fiel ao assombrado realismo do seu universo para construir uma narrativa que vai deslizando para uma ambiência de absurdo, pontuado por delirantes marcas burlescas.
À partida, existe um pretexto mais ou menos policial: a descoberta de um crime macabro nos campos em que Quinquin gosta de se refugiar. Em todo o caso, a investigação que se desenvolve, conduzida pela surreal personagem do comandante Van der Weyden (Bernard Pruvost), não vive tanto desse mistério, como dos enigmas ambulantes que são as personagens desta farsa afinal encenada à flor da pele — e os espantosos actores locais, completamente amadores, não serão alheios à singularidade dos resultados.
Produzido pelo canal franco-alemão Arte, "O Pequeno Quinquin" constitui um exemplo modelar de uma inventiva articulação cinema/televisão (que, neste caso, gerou um objecto que é, de uma só vez, uma mini-série e uma longa-metragem para as salas escuras). Acima de tudo, Dumont demonstra que é possível trabalhar através de convenções mais ou menos correntes, gerando uma obra que transcende lugares-comuns éticos e estéticos.
João Lopes, www.rtp.pt/cinemax
EXTENSÃO DO 12º INDIELISBOA 2015

TEATRO MUNICIPAL DE FARO

Dia 6 de Maio 
19:00
A Toca do Lobo, Catarina Mourão (Portugal) - Prémio do Público para Longa Metragem Fox Movies

21:30
Ming of Harlem: Twenty One Storeys in The Air, Phillip Warnell (Reino Unido, Bélgica, EUA) - Prémio SIC Universidades

Dia 7 de Maio
19:00 
Rabo de Peixe – (Director’s Cut), Joaquim Pinto, Nuno Leonel (Portugal) - Prémio TAP para Documentário Português de Longa Metragem

21:30
Ela Volta na Quinta, André Novais Oliveira (Brasil)