não, não é mais uma comédia sobre adolescentes: esta é uma BOA comédia! UNS BELOS RAPAZES do autor de BD Riad Sattouf.

2ªF 31, IPJ, 21H30.

Um borbulhoso retrato do estranho, selvático e incrivelmente desconfortável tempo da adolescência, UNS BELOS RAPAZES coloca uma mão cheia de gargalhadas de torcer o coração directamente no focinho.


O desenhador de Banda Desenhada Riad Sattouf estreia-se com um conto divertido sobre um par de falhados que vive pequenos triunfos e humilhações intermináveis de uma ânsia sexual adolescente, oferecendo-nos uma série de grosseiros ao estilo de Super Baldas e American Pie – apesar de neste filme se utilizar como suporte uma meia já usada.


Embora o filme adolescente conhecido como o tenho-de-dar-queca tenha sido rotineira e ainda mais eficazmente explorado no passado, Sattouf e o co-argumentista Marc Sygras (Replay) oferecem uma forma de comédia ainda mais cruel, presenteando uma série de gargalhadas visuais – numa média de uma ou duas por cena – concentrada em todos os poros oleosos das suas personagens.


Enquanto várias sequências mostram os dois a beijarem desmazeladamente desde raparigas a espelhos aos dedos de outros em planos nauseantes apertados, outros são frescos e criativamente humorísticos, revelando olho para as traquinices nos storyboard – algo que já tinha provado com as suas BD.


Os pontos fracos de Hervé são particularmente complicados na presença da sua mãe tagarela. Existe algo de bizarramente incestuoso na relação deles (tal como existe algo de flagrantemente homoerótico na sua amizade com Camel), e o realizador usa tal conteúdo para mostrar a puberdade como um momento doloroso em que experienciamos diferentes identidades, na esperança de encontrar alguma que nos sirva. Tais humilhações são extremamente bem manejadas pelo cast de desconhecidos, especialmente Lacoste, que nos apresenta Hervé, como uma personagem em constante evolução e entrega, que não consegue escapar às suas inúmeras imperfeições.
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Jordan Mintzer, Variety


É uma primeira obra, a estreia de Riad Sattouf (n. 1978), autor francês de BD. O universo adolescente, ao que podemos saber, é um dos temas preferidos dos seus livros, e foi o tema que escolheu abordar no seu primeiro filme. Os "belos rapazes" (na verdade, incrivelmente feios e borbulhentos, a adolescência em todo o seu hiper-realístico esplendor) são uma dupla de alunos de liceu obcecados com a sua própria libido, que é inversamente proporcional aos seus talentos de sociabilização. Todas as mulheres (as colegas, as mães delas, as professoras) são potenciais objectos de fantasia, mas esse mundo mental dificilmente coincide com o mundo real. Esta difícil coincidência alimenta "Uns Belos Rapazes", que filma a adolescência masculina como um território monotemático, onde toda a imaginação conduz sempre ao mesmo, mas onde o "mesmo" raramente passa da imaginação. Sattouf acompanha esta "selvajaria" das suas personagens com uma certa elegância (e com uma certa empatia, talvez até com alguma nostalgia), matizando-lhes o recorte estereotipado (que é obviamente fundamental) com algumas subtis notações psicológicas (por exemplo toda a relação entre um dos rapazes e a mãe, interpretada por Noémie Lvovsky).


Se o ambiente é "realista", e quer o liceu quer o círculo em que as personagens se movem são perfeitamente plausíveis, a sua importância é limada, como se a psique adolescente fosse uma coisa que se impõe a tudo. Como é evidente, ficamos próximos do "cartoon" (até na maneira como Sattouf compõe as cenas e nalguns casos até os planos), no sentido em que, porventura demasiadas vezes, persegue apenas o efeito grotesco (a insistência nas borbulhas, nos aparelhos dentários, etc). Mas, e é aquilo que Sattouf consegue melhor, o filme salva-se do "cartoonismo" inconsequente (não importa quão divertido) pela maneira como integra a voracidade desamparada das suas personagens numa espécie de "visão do mundo", e transformar-se no seu retrato.
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Luís Miguel Oliveira, Público


ENTREVISTA
Já considerado como um autor de banda desenhada hilariante (Pascal Brutal, La Vie Secrète des Jeunes), Riad Sattouf estende ao cinema a sua fábrica de descrições sobre os ingratos anos estudantis. E vigoroso, com um belo casting de borbulhosos e uma banda sonora a calhar, o seu primeiro filme coloca-se no lugar de melhor teen-movie francês… em muito tempo.
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Porque é que escolheu fazer um filme depois de tantos anos a trabalhar em BD?
Não sou um grande cinéfilo, mas estudei Cinema de Animação e, como muitos desenhadores, desejava um dia que as minhas histórias não fossem animadas. A banda desenhada conta histórias de uma certa forma, e o cinema de outra, e o que eu prefiro fazer na vida é contar histórias… Dito isto, o peso dos processos de criação esgotam-me antecipadamente: eu não quero massacrar-me a montar um projecto e a convencer um produtor a ajudar-me a realizá-lo para depois mudar de ideias sobre o argumento só para não chocar as associações católicas… Acho que tive muita sorte em encontrar produtores que adoraram as minhas BD e deixaram-me fazer o filme que queria.



Les Beaux Gosse leva para o cinema francês o melhor do teen-movie contemporâneo. Pensamos muito em produções de Judd Apatow, Super Baldas em particular…
Vi Super Baldas durante as filmagens porque toda a gente me falava no filme. Mas eu não achei os dois filmes tão semelhantes, à excepção de eles serem sobre dois adolescentes muito obcecados e muito feios… Na verdade, não conheço a tal ponto essa nova comédia americana, nem os seus modelos. O que me leva a rir é muitas vezes aquele assunto suficientemente sério. Por exemplo, uma reportagem sobre os adolescentes hoje em dia é classificado como sendo um tema muito alarmante, mas eu acho isso hilariante. É exactamente isso que eu desejo transcrever. Eu queria ser muito realista, e para isso mantive-me fiel a um dos meus livros, Manual de Puceau¸ inspirado nos meus próprios anos como estudante, nos quais eu tinha a impressão de ter êxito em qualquer matéria de aproximação naturalista.



A originalidade do filme no quadro do cinema francês é que é um olhar sobre os adolescentes nunca vista. O que é que este olhar tem de tão especial?
Foi uma coisa essencial para mim, tínhamos de estar sempre à mesma altura. Filmei exactamente o mundo deles, portanto, não existem outros pontos de vista válidos que não sejam os deles. Há momentos de verdadeira crueza no filme, que fazem com ninguém os julgue ou façam troça deles. Sobretudo, não quis aproximar-me deles como fauna estrangeira. Tenho de atacar as coisas pelas bases. Quando tu és adolescente, e vives um pouco à margem e o teu corpo não se modifica à semelhança da tua vontade, és obrigado a inventar uma visão exterior do mundo, um código, uma classificação para as pessoas à tua volta que te permita compreender, porque, com aquela idade, certas coisas só acontecem a um certo tipo de pessoas. É qualquer coisa de suficientemente primitivo e animal. É aí, sem dúvida, que o meu filme se assemelha a Super Baldas: disse-me a mim mesmo que seria mais interessante abordar as coisas do ponto de vista dos nulos, em vez de partir do colegial médio no qual todos se poderiam projectar.
INROCKUPTIBLES



Título Original: Les Beaux Gosses
Realização: Riad Sattouf
Argumento: Riad Sattouf Et Marc Syrigas
Interpretação: Vincent Lacoste, Anthony Sonigo, Alice Trémolières, Noémie Lvovsky
Direcção de Fotografia: Dominique Colin
Música: Flairs e Riad Sattouf
Montagem: Virginie Bruant
Origem: França
Ano de Estreia: 2009
Duração: 90’


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