as MUITO divertidas histórias de 6 realizadores romenos: castigar as ditaduras com sarcasmo. 2ªf, dia 8, IPJ, 21h30.



(sócios 2€, estudantes 3,5€, restantes 4€)

NOTA DE INTENÇÕES
O CONCEITO
Histórias da Idade de Ouro (site) propõe uma visão original e subjective do fim do comunismo na Roménia, através de histórias extraordinárias que aconteceram a pessoas normais. Nós, romenos, consideramos estes “mitos urbanos” histórias verdadeiras, transmitidas pela tradição oral. Estas histórias eram o tema principal de conversa nas longas filas provocadas pelo racionamento de comida. O humor permitiu aos romenos sobreviver e Histórias da Idade de Ouro procura recuperar esse espírito.

O projecto consistia em mergulhar com alguma nostalgia na época da nossa adolescência, nos anos 80, através da música, linguagem, objectos e estereótipos dessa época. O filme oferece o retrato de uma nação que tenta sobreviver ao dia-a-dia face à implacável lógica da ditadura, revelando na passagem aspectos cómicos de um sistema político que se leva demasiado a sério.

A ESTRUTURA
Histórias da Idade de Ouro é composto por histórias ligadas pelo ambiente da época e os detalhes históricos: o único carro que se via na rua era a versão local do Renault 12, o Dacia; só há duas horas de televisão; toda a gente rouba as reservas do Estado; a comida é mais importante que o dinheiro; é preciso obedecer ao Partido, mesmo se as ordem são perfeitamente ilógicas. Toda a gente usa uma máscara de lassidão e, no entanto, no fundo de cada um, todos estão vivos, e procuram amar e ser amados.

A ABORDAGEM ARTÍSTICA
Depois de uma projecção do 4 MESES, 3 SEMANAS E 2 DIAS, um espectador disse-me que achava que cada vez mais os realizadores faziam filmes para os festivais e não para o público. Perguntou-me se podia remediar isso. Decidi então abrir o projecto Histórias da Idade de Ouro a vários realizadores romenos na condição de terem idade suficiente para terem vivido naquele período. Escolhi as histórias, escrevi o argumento, participei nos vários castings e montagem dos vários filmes, de forma a que se tornasse um filme coerente e não uma acumulação de pontos de vista. Mas cada realizador podia guardar o seu livre-arbítrio e o seu estilo.

Histórias da Idade de Ouro inscreve-se, na minha opinião, na linhagem dos filmes italianos dos anos 60 e 70, filmes directos e divertidos. Tentei encontrar com este filme a alma popular do cinema.
Christian Mungiu




Mais um grande filme saído da Roménia, tutelado por Cristian Mungiu (4 Meses, 3 Semanas e 2 Dias) que também produz e escreveu todos os episódios, realizando um deles e entregando os restantes a Hanno Höffer, Razvan Marculescu, Constantin Popescu e Ioana Uricaru. Todos se passam nos últimos 15 anos da ditadura comunista de Ceausescu (a referência a uma “Idade de Ouro” no título é descomunalmente irónica).

Como a rir é que se castigam não só os costumes, como também os absurdos, os ridículos, as misérias, as mesquinhices e as prepotências do totalitarismo, todos os segmentos de Histórias da Idade de Ouro são cómicos, se bem que alguns deixem um aftertaste ácido. As histórias tratam de assuntos tão diversos como a passagem do Secretário-Geral do Partido Comunista por uma aldeola onde não há pombos brancos para largar e um carrocel a estragar a paisagem, o problemático retocar de uma fotografia de Ceausescu numa cerimónia oficial que vai sair no jornal, ou a matança de um porco trazido às escondidas da aldeia para um bloco de apartamentos de Bucareste – e que acaba por se transformar numa arma de destruição de alcance limitado.

Um filme que diz mais sobre o que significava viver o dia-a-dia sob uma ditadura de Leste do que muitos volumes especializados.
Sérgio Abranches, TimeOut



Hilariante. Escrito pelo vencedor da Palma de Ouro, Cristian Mungiu, que também realiza um dos segmentos, é um filme irresistível. Não só todas as partes são muito fortes, como o seu efeito cumulativo nos dá um retrato surreal da vida da Roménia nos anos 80.
Screen International

Histórias absurdas, surrealistas, que denunciam com humor negro a perversidade do regime e o fim do comunismo. Super divertido.
Le Figaroscope


Com ainda se pode rir do período mais dramático do regime de Ceausescu? Os romenos podem e valem...

Há meia dúzia de anos eram uma promessa, hoje já são uma certeza. Dantes eram cinema emergente agora já têm presença consolidada em festivais de todo o mundo e chegam às salas comerciais. Histórias da Idade de Ouro vem com a assinatura de Cristian Mungiu (ganhou a Palma de Ouro em Cannes, em 1997, com 4 meses, 3 semanas e 2 dias), mas ainda não é o grande filme sequencial daquele que virou todas as atenções mundiais para o novo cinema romeno E o 4,3,2 é de facto, um filme extraordinário, com um apuradíssimo entrelaçamento formal e narrativo.

Mas não restam dúvida de que é novo este cinema, uma lufada de ar fresco no panorama europeu, a provar que os milagres existem, e que um cinema em estado comatoso, pode a qualquer momento despertar, vivo e a dar pontapés. Os realizadores nasceram na década de 60 e 70, e auto-intitulam-se a "geração dos filhos do decreto", porque foram fruto de um baby boom provocado por um decreto em que Ceausescu proibia abortos e não facilitava a contracepção.

No seguimento de Califórnia Dreamin', de Cristian Nemescu (prémio Un Certain Regard, em Cannes), ou de A Morte do Sr Lazarescu, de Cristi Puiu ou de 12:08 a Este de Bucareste, de Corneliu Porumboiu, chega-nos agora estas Histórias da Idade de Ouro (ante-estreou no Indie), seis curtas-metragens todas elas escritas e produzidas por Mungiu, uma filmada por ele, as restantes por novos autores (das suas respectivas filmografias só constam duas ou três curtas).

E só o título vem carregado de ironia. Os últimos 15 anos de Ceausescu foram considerados dos piores na história da Roménia, no entanto a máquina propaganda chamava-lhes "os anos de ouro". Nestas seis curtas, em que se retratam alguns mitos urbanos (histórias que se contavam como verdadeiras, e se non è vero, è ben trovato), os romenos voltam a mostrar que é possível rir-se de si próprios, mesmo quando viviam debaixo de um demencial totalitarismo à asiática.
É um humor de guerrilha, que ataca quando menos se espera, e investe nos locais mais improváveis. Ao revisitar um regime ainda tão quente na memória colectiva ( a revolução romena aconteceu em Dezembro de 89), os realizadores podiam mostrar a desgraça, a decadência, a demência - e fazem-no, só que não através do registo trágico (como Mungiu optara no seu 4, 3, 2) mas através da sátira, do riso, do escánio... E isto pode ser muito mais demolidar, e ter do mesmo modo um efeito denúncia.



No retrato do país daquele tempo em que "a comida era mais importante que o dinheiro, a liberdade mais importante que o amor e a sobrevivência mais importante que os princípios" - na história de um fotógrafo que tem de fazer os famosos photoshop, noutras duas que envolvem tráfico de garrafas de ovos, na do polícia ganancioso que leva para o seu exíguo apartamento um porco vivo, noutra de um diligente militante em campanha de alfabetização na Roménia, e no extraordinário caso de uma aldeia que se engalana para receber uma comitiva oficial - não é só o regime que sai caricaturado, mas os próprios romenos, vítimas sim, mas dotados de um chico-espertismo que parece não ser só propriedade nossa.

Quando os portugueses falam do regime de Salazar, não ousariam fazer comédias (ou talvez Fantasia Lusitana, de João Canijo tenha ido mais por esse lado, mostrando no seu documentário a tragicomédia de um país), pelo contrário salientam o sofrimento, a opressão, o penar dos perseguidos, a pobreza, a miséria... Os romenos também o fazem, mas com a enorme superioridade moral de saber gozar consigo próprios... Aliás, eles têm uma palavra para isto: "Râsu-plânsu". Em português seria qualquer coisa como "chorir" - se alguma vez nós nos tivéssemos lembrado de inventar uma palavra para "rir e chorar ao mesmo tempo", ou para "gozar com a própria desgraça". E para usar quando as coisas já estão tão mal, que já só vale a pena rir. E este enorme talento de rir de si próprios é ao mesmo tempo regenerador e catártico. Desassombradamente, sem a miopia da distância, nem o astigmatismo da proximidade.
Ana Margarida de Carvalho, Visão


Título Original: Amintiri Din Epoca de Aur
Realização: Ioana Uricaru, Hanno Höffer, Rãzvan Mãrculescu, Constantin Popescu, Cristian Mungiu
Argumento: Cristian Mungiu
Direcção de Fotografia: Oleg Mutu, Alex Sterian, Liviu Mãrghidan
Música: Hanno Höffer, Laco Jimi
Montagem: Dana Bunescu, Theodora Penciu, Ioana Uricaru
Interpretação: Diana Cavallioti, Radu Iacoban, Vlad Ivanov, Tania Popa, Liliana Mocanu, Alexandru Potocean,
Teodor Corban, Emanuel Parvu, Calin Chirila, Romeo Tudor, Avram Birau, Paul Dunca, Viorel Comanici, Ion Sapdaru
Origem: Roménia
Ano de Estreia: 2009
Duração: 155’



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