DIA 29 ABRIL
FRANCES
HA, Noah Baumbach, EUA, 2012,
86’, M/12
FICHA TÉCNICA
Realização: Noah
Baumbach
Interpretação: Greta Gerwig, Mickey Summer,
Adam Driver, Michael Zegen, Patrick Heusinger
Origem: E.U.A.
Ano: 2012
Duração: 86’
SINOPSE
Aos 27 anos, Frances chega a Nova
Iorque absolutamente determinada a realizar o seu sonho mais antigo: tornar-se
bailarina numa importante companhia de dança. Ao mesmo tempo que se vai
esforçando por ser feliz no dia-a-dia e aproveitar os detalhes mais doces da
sua vida, ela vai provando a si mesma que, apesar das dificuldades, será capaz
de atingir tudo aquilo a que se propuser. E é assim, completamente convicta de
cada um dos seus passos, que vai aprender a conquistar o mundo...
Com realização de Noah Baumbach ("A Lula e a Baleia", "Margot e o Casamento", "Greenberg"), que escreve o argumento em parceria com Greta Gerwig, também protagonista do filme, uma história sobre sonhos e expectativas de uma jovem que se recusa a perder o optimismo ou a crença na Humanidade.
Com realização de Noah Baumbach ("A Lula e a Baleia", "Margot e o Casamento", "Greenberg"), que escreve o argumento em parceria com Greta Gerwig, também protagonista do filme, uma história sobre sonhos e expectativas de uma jovem que se recusa a perder o optimismo ou a crença na Humanidade.
TRAILER
CRÍTICA
Uma história de Nova Iorque que é uma ode ao
talento de Greta Gerwig e o melhor filme de Noah Baumbach.
Todos sabemos como é difícil resistir às tentações, e a primeira que nos surge perante Frances Ha é a mais irresistível de todas: comparar o novo filme de Noah Baumbach aos anos de ouro de Woody Allen. Rodado num luminoso preto e branco (como o glorioso Manhattan), fazendo de Nova Iorque personagem a parte inteira do filme (pontuado pelas moradas onde a heroína vai assentando arraiais), Frances Ha é uma gloriosa ode à nova musa de Baumbach, Greta Gerwig, cuja mera figura nos remete para Diane Keaton quando Allen dela fez a sua musa nos anos 1970. O filme é uma “história de Nova Iorque” acompanhando alguns meses na vida de uma bailarina em crise, que acabou com o namorado e viu a sua melhor amiga mudar de casa. Mas é também uma história de Nova Iorque rodada através do olhar arregalado de uma Nouvelle Vague quando descobriu outro modo de olhar para, e filmar, uma cidade, e de contar histórias sem respeitar forçosamente as convenções da narrativa tradicional.
Todos sabemos como é difícil resistir às tentações, e a primeira que nos surge perante Frances Ha é a mais irresistível de todas: comparar o novo filme de Noah Baumbach aos anos de ouro de Woody Allen. Rodado num luminoso preto e branco (como o glorioso Manhattan), fazendo de Nova Iorque personagem a parte inteira do filme (pontuado pelas moradas onde a heroína vai assentando arraiais), Frances Ha é uma gloriosa ode à nova musa de Baumbach, Greta Gerwig, cuja mera figura nos remete para Diane Keaton quando Allen dela fez a sua musa nos anos 1970. O filme é uma “história de Nova Iorque” acompanhando alguns meses na vida de uma bailarina em crise, que acabou com o namorado e viu a sua melhor amiga mudar de casa. Mas é também uma história de Nova Iorque rodada através do olhar arregalado de uma Nouvelle Vague quando descobriu outro modo de olhar para, e filmar, uma cidade, e de contar histórias sem respeitar forçosamente as convenções da narrativa tradicional.
Mas as tentações, e
as aparências, não são tudo, e a cinefilia é apenas uma porta de entrada
possível para Frances Ha, cuja joie de vivre desembaraçada esconde também a
fábula angustiada do desemprego moderno, bem como o questionamento existencial
que Baumbach tornou no seu tema principal desde A Lula e a Baleia (2005) - o
modo como as pessoas enfrentam as mudanças que ocorrem nas suas vidas. Como se
diz a certa altura, “as únicas pessoas em Nova Iorque que se podem dar ao luxo
de ser artistas são as que têm dinheiro”, e essa questão é central à história
de Frances, uma de tantas bailarinas em dificuldades para arranjar emprego e
cujas idiossincrasias emocionais a tornam subitamente incapaz de manter um
nível de vida nova-iorquino que nem sequer é particularmente elevado.
Procurando
encontrar o seu lugar no mundo adulto apesar de estar quase à beira dos 30
anos, Frances é o “gémeo” nova-iorquino do Ben Stiller moroso e paralisado de
Greenberg (2009), o anterior filme de Baumbach. Onde aquele surgia ofuscado
pela luz da Califórnia, com a fotografia queimada de Harris Savides a evocar o
cinema da “nova Hollywood”, Frances Ha contrasta-o com o preto e branco
classicista de Sam Levy a invocar as experiências dos indies nova-iorquinos
originais, substituindo a relutância resmungona de Stiller pela angústia
cabeça-no-ar de Gerwig. E a actriz confirma de uma vez por todas porque é que
se está rapidamente a tornar numa das mais estimulantes figuras do moderno
cinema americano, comédienne de primeira água cuja simples presença física
empresta algo de Chaplinesco e de encantador à sua personagem.
Mais do que
transportar o filme, Greta Gerwig é, ela própria, o filme. É a sua energia que
propulsiona Frances Ha; e Baumbach aproveita-a e explora-a para fazer deste o
que é, para nós, o melhor dos seus filmes, um irresistível (mas nunca pedante)
bombom cinéfilo dobrado de comovente comédia doce-amarga sobre o mundo em que
vivemos. Um filme aberto ao mundo, e à cidade.
Jorge Mourinha, Ípsilon
FRANCES HA O Kama Sutra dos amores platónicos
Em Francis Ha, o novo filme de Noel Baumbach, as personagens vão para a
cama para fazer... amizade. Assim mesmo, às cambalhotas, nas mais diversas
posições, num Kama Sutra casto, com mais ou menos roupa, a preto-e-branco, como
de antigamente. Os amores platónicos são os únicos que nunca se desfazem.
Em Francis Ha, o novo filme
de Noel Baumbach, as personagens vão para a cama para fazer... amizade. Assim
mesmo, às cambalhotas, nas mais diversas posições, num Kama Sutra casto, com
mais ou menos roupa, a preto-e-branco, como de antigamente. Os amores
platónicos são os únicos que nunca se desfazem. Há laços que mais parecem nós.
Noel Bamubach foi aquele realizador que surpreendeu a América (e talvez mais
ainda a Europa), em 2005, com a Lula e a Baleia, uma história de desencontros
familiares, filmada de forma naturalista, com um sentido de humor implacável.
Produção independente, claro está, mas não demasiado arriscada, chegou para
convencer a indústria. E, apesar do bom gosto, esperava-se um caminho de
assimilação semelhante a tantos outros (como Jason Reitman ou David O.
Russell). Mas houve apenas o aproveitamento do argumentista para séries de televisão
ou até mesmo os filmes de animação O Fantástico Sr. Raposo e Madagáscar 3.
Enquanto realizador, Baumbach revelou que 'indie' não era uma circunstância
derivada do baixo orçamento, mas sim uma forma de encarar a arte. Se tal já era
detetável no anterior Greenberg, torna-se flagrante em Francis Ha.Há um claro tributo à primeira geração da
Nouvelle Vague francesa, além do uso do preto-e-branco, que no caso dos
primeiros Godard terá sido fruto de uma carência tecnológica e não de uma opção
estética (como acontece em Baumbach). Ao filmar a preto-e-branco, encosta-se
antes a realizadores com Jim Jarmusch ou Wim Wenders. Porque, no caso, o preto
e branco não vem de uma sugestão do meio envolvente, a cidade de Nova Iorque,
mas apenas de um estado de espírito e de uma demanda estética.
Também se pode
encontrar o tributo à Nouvelle Vague em pormenores como o chapéu de Dan ou as
cenas de cama. Mas há sobretudo uma forte influência na forma naturalista de
lidar com os atores, que nos transmite a ideia de espontaneidade de quotidiano.
Mas enquanto Jarmusch e Hal Hartley o fazem muitas vezes através de diálogos
parados em busca de pequenos pormenores que nos dão uma sensação de non sense
realista, Baumbach cria maior dinamismo através de uma personagem rica na sua
ambiguidade. Uma bailarina desajeitada, cheia de sonhos que passam pela recusa
determinada em passar definitivamente para a idade adulta, apesar dos seus 27
anos.
Francis Ha não tem propriamente uma casa. Vive com uma amiga. É de uma fidelidade extrema. Funcionam como um casal. Elas próprias se definem como um casal de lésbicas que já não tem sexo há muito tempo. Essa frase serve, de resto, para abrandar a tensão sexual e afastar a perspetiva óbvia. Colocando a questão ao nível do amor platónico. Amor este que, no entanto, é bloqueador de amores realizáveis. Francis fica com o coração partido quando Sophie quebra a lógica e, a três tempos, muda de casa, arranja um namorado e emigra para o Japão. Francis, que se mantém constante, igual a si própria, tenta fazer uma réplica do modelo na nova casa que vai viver. Mas padece de falta de dinheiro e de estímulo. Só não lhe falta persistência.
Francis Ha vive de um sentido de humor subtil, inteligente e quotidiano, que rodeia a personagem de Francis. A vida não chega a ser madrasta para Francis. Tudo se recompõe. E o filme, que nos mostra pormenores do dia-a-dia que não estamos habituados a ver no cinema, acaba por funcionar de retrato de uma certa geração nova-iorquina. E de uma forma casta, em que o sexo é de tal forma banalizado que se torna desinteressante. Um pós-hippie urbano, em louvor das novas famílias, que repudiam o modelo burguês de consanguinidade, em direção aos lares construídos espontaneamente, em círculos de amigos.
Manuel Halpern, visao.sapo.pt/f
Francis Ha não tem propriamente uma casa. Vive com uma amiga. É de uma fidelidade extrema. Funcionam como um casal. Elas próprias se definem como um casal de lésbicas que já não tem sexo há muito tempo. Essa frase serve, de resto, para abrandar a tensão sexual e afastar a perspetiva óbvia. Colocando a questão ao nível do amor platónico. Amor este que, no entanto, é bloqueador de amores realizáveis. Francis fica com o coração partido quando Sophie quebra a lógica e, a três tempos, muda de casa, arranja um namorado e emigra para o Japão. Francis, que se mantém constante, igual a si própria, tenta fazer uma réplica do modelo na nova casa que vai viver. Mas padece de falta de dinheiro e de estímulo. Só não lhe falta persistência.
Francis Ha vive de um sentido de humor subtil, inteligente e quotidiano, que rodeia a personagem de Francis. A vida não chega a ser madrasta para Francis. Tudo se recompõe. E o filme, que nos mostra pormenores do dia-a-dia que não estamos habituados a ver no cinema, acaba por funcionar de retrato de uma certa geração nova-iorquina. E de uma forma casta, em que o sexo é de tal forma banalizado que se torna desinteressante. Um pós-hippie urbano, em louvor das novas famílias, que repudiam o modelo burguês de consanguinidade, em direção aos lares construídos espontaneamente, em círculos de amigos.
Manuel Halpern, visao.sapo.pt/f
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