A NOITE CAIRÁ
André
Singer, Reino Unido, 2014, 75’, M/14
FICHA TÉCNICA
Realização: André Singer
Argumento: Lynette Singer
Fotografia: Richard Blanshard
Montagem: Arik Lahav, Steve Miller
Som: Aviv Aldema
Compositor: Nicholas Singer
Argumento: Lynette Singer
Fotografia: Richard Blanshard
Montagem: Arik Lahav, Steve Miller
Som: Aviv Aldema
Compositor: Nicholas Singer
Origem: Reino Unido
Ano: 2014
Duração: 75’
A 15 de Abril de 1945, as tropas britânicas libertaram o campo de concentração de Bergen-Belsen. Uma equipa de filmagens filmou as pilhas de cadáveres e os sobreviventes, provas irrefutáveis dos crimes cometidos pelo regime Nazi. O produtor Sidney Bernstein planeava usá-las num filme e convidou Alfred Hitchcock para o montar. Mas, depois do fim da Guerra, as forças de ocupação mudaram a sua política e em vez de confrontar a Alemanha com a culpa, preferiram instalar a confiança para tornar possível a reconstrução do pós-Guerra. E estas imagens de horror indizível foram confinadas aos arquivos. A Noite Cairá segue as pisadas deste filme inacabado conhecido como o “Hitchcock perdido”.
CRÍTICA
O documentário de Singer coloca o cerne da questão no
projecto do produtor Sidney Bernstein, que devido a um conjunto de
circunstâncias relacionadas com a instabilidade política do pós-guerra nunca
chegou a ser completado. Até hoje: no final de 2014 o Imperial War Museum
regressou às imagens recolhidas pelos soldados, num importantíssimo trabalho de
digitalização e restauração. Um dos aspectos mais determinantes no projecto
concebido por Bernstein, e que nunca chegou a ser verdadeiramente concretizado,
está relacionado com o envolvimento de Alfred Hitchcock.
As imagens recolhidas pela equipa de Bernstein seriam o ponto de partida para
aquele que seria o único documentário da carreira de Hitchcock. Uma das razões
avançadas para a inviabilidade do projecto prende-se com a recusa em acolher o
elevado número de refugiados judeus, tanto da parte dos Estados Unidos como do
Reino Unido. Perante a intensidade visceral das imagens, temia-se que o
documentário não cumprisse o seu propósito fundamental - que passava em larga
medida pela demonstração da dimensão dos crimes cometidos pelo regime Nazi -,
tornando-se antes numa ferramenta de pressão política; sensibilizada pela
injustiça atroz cometida contra o povo judeu, havia a hipótese da população
manifestar forte apoio ao acolhimento dos refugiados em território aliado.
Por outro lado, e esta era uma questão primordialmente referente ao contexto do
Reino Unido, haveria também o receio que a divulgação do documentário
contribuísse para a desmoralização do povo alemão, frequentemente
responsabilizado pelas ações do seu regime; com os primeiros sinais de uma
guerra fria a poluir o horizonte político, a prioridade passavam também por
evitar alienar um potencial aliado contra a então União Soviética. Em ambos os
casos, é esta uma das dimensões da difícil relação entre o sentido último da
história e a "imagem", e que parece fazer eco de algumas das reservas
avançadas por Lanzamnn. Singer nunca entra em diálogo explicito com o debate
lançado por Lanzmann, tão pouco nos moldes em que o realizador de Shoah colocou
a questão, mas o que aqui importa sublinhar é a importância de uma reflexão
sobre a relação entre imagem e a (re)construção da História.
Um dos motivos de maior interesse do documentário de
Singer passa pela aproximação às sugestões e instruções dadas por Hitchcock à
equipa de Bernstein. Para evitar suspeitas sobre a credibilidade das imagens,
Hitchcock recomendou que se utilizassem planos e sequências longas – daí a
insistência nos momentos em que é possível ver as campas a céu aberto com os
corpos dos judeus, com soldados nazis junto das suas vítimas. Outra sugestão
foi a de demonstrar a proximidade entre os campos de concentração e povoações
civis, de uma maneira ou de outra implicadas naquela tragédia.
Algumas das imagens restauradas pelo Imperial War Museum vão sendo intercaladas
ao longo de toda a exposição factual de A Noite Cairá, e o que é
aqui também impressionante é a "nitidez" ou "realismo" que
o digital vem trazer a este imprescindível documento histórico. É que a
degradação das imagens de arquivo tendem a distanciar-nos do momento histórico
em que foram recolhidas: é oposto da impressão provocada pela alta definição
digital e da sua relação afetiva com o espetador.
A obra não nos apresenta uma leitura do sentido último do Holocausto, mas
relembra-nos da nossa proximidade histórica com o horror do Nazismo.
O melhor: A
contextualização da dimensão política do documentário.
O pior: Nada a apontar.
José Raposo, www.c7nema.net
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