I,
DANIEL BLAKE
Ken Loach
Reino Unido/França/Bélgica, 2016, 100’, M/12
FICHA TÉCNICA
Realização: Ken Loach
Argumento: Paul Laverty
Montagem: Jonathan Morris
Fotografia: Robbie Ryan
Música: George Fenton
Interpretação: Dave Johns, Hayley Squires Sharon Percy, Briana Shann, Dylan McKiernan
Origem: Reino Unido/França/Bélgica
Ano: 2016
Duração: 100’
FESTIVAIS E PRÉMIOS
Realização: Ken Loach
Argumento: Paul Laverty
Montagem: Jonathan Morris
Fotografia: Robbie Ryan
Música: George Fenton
Interpretação: Dave Johns, Hayley Squires Sharon Percy, Briana Shann, Dylan McKiernan
Origem: Reino Unido/França/Bélgica
Ano: 2016
Duração: 100’
FESTIVAIS E PRÉMIOS
Cannes 2016 - Palma d’Ouro, Palm DogManitarian Award, Prize of the Ecumenical Jury – Special Mention
Locarno International Film Festival 2016 – Prémio do Público
San Sebastián International Film Festival 2016 - Prémio do Público
Locarno International Film Festival 2016 – Prémio do Público
San Sebastián International Film Festival 2016 - Prémio do Público
CRÍTICAS
Uma
fábula realisticamente absurda sobre o estado do “estado social” na Europa.
“Kafkiano” pode servir a Eu, Daniel Blake, a Palma de Ouro de Cannes.
Deve ter a ver com o poder misterioso da letra
“k”, mas à medida que o filme de Ken Loach avança mais o nosso espírito vê o
seu protagonista, Daniel Blake, como um parente afastado do famoso herói do Processo de Kafka, conhecido
apenas por Josef K. Sugestão, certamente, e insondáveis são os caminhos da
imaginação, pelo que quem nunca pecou por delírio que atire a primeira pedra.
Mas, em rigor, um bocadinho mais do que só sugestão: também este homem com “k”
no apelido é atirado para um pesadelo burocrático que não domina, não controla,
e que o culpa de alguma coisa. Uma culpa um bocadinho mais concreta, e mais
comezinha, do que a da personagem de Kafka: é um operário (da construção civil)
e está doente do coração. Ser um trabalhador doente, essa é a sua culpa. O
filme de Loach, ancorado nos “processos” específicos do regime laboral
britânico, é uma fábula realisticamente absurda sobre o estado do “estado
social” na Europa, e dos seus meandros, que o adjectivo “kafkiano”, na sua
acepção mais corrente e naturalizada, também pode servir para qualificar.
Como
cineasta, Loach tem dias. Este é um dia sim, e para além do vigor e da
mordacidade de Eu, Daniel
Blake está aqui o melhor da faceta politicamente combativa do inglês.
Ele que diz continuar a acreditar - no documentário sobre ele que se estreia em
paralelo, Versus -
que falar de “política” e falar de “vidas” são coisas inseparáveis. Ou melhor,
que falar de “vidas” não deixa de implicar a “política”. Eu, Daniel Blake é um bom
exemplo: a eficácia do filme reside na sua insistente permanência junto das
personagens, na descrição das suas vidas quotidianas, na sua humanidade tão
esfusiante quanto reprimida. A que não falta um toque britânico, o humor na
face da adversidade, o stiff
upper lip que não é exclusivo das upper classes. Vemo-lo, por exemplo, nas cenas
em que Daniel Blake, inábil no uso de um computador, tem que preencher
formularios online,
em duelo com as minutas, com a linguagem, com o rato. Vemo-lo na reacção ao
crescente desespero, com aquela pichagem na parede (Eu, Daniel Blake...) a que ele chama, a rir-se,
street art. A
propósito, “arte de rua” era uma boa maneira de caracterizar o cinema de Loach:
é arte que “não entra”, e Daniel Blake está sempre de fora. De fora dos
códigos, do sistema de pontos (“mas isto é um jogo?”) que o avalia e, contra a
opinião do médico, o declara apto para trabalhar. Os serviços de apoio estatal
são uma “parede” contra a qual Blake permanentemente bate, uma instância
incorpórea e sem rosto que perdeu a capacidade de reconhecer a humanidade, os
corpos e os rostos (e por exemplo nos telefonemas de Blake para os serviços
quase nunca há contracampos do outro lado, fica-se só com as vozes, as vozes do
“sistema”).
Não são
os anos 20 de Kafka, e também não são os anos 30 de Capra. Eu, Daniel Blake tem também
um bocadinho - ver a sequência final, o discurso da amiga do protagonista - de
fábula capriana em reverso ou em negativo. A diferença é que Capra acreditava
que as instituições, com uns empurrõezinhos aqui ou ali, estavam do lado do
Bem. Loach, manifestamente, não acredita. Ou então não é questão de crença, é
só a Europa do século XXI.
Luís
Miguel Oliveira, Público
Ken
Loach e a resistência do realismo
Figura
ímpar do realismo britânico, Ken Loach está de volta com mais um dramático
retrato social: "Eu, Daniel Blake", protagonizado por Dave Johns,
arrebatou a Palma de Ouro da 69ª edição do Festival de Cannes.
O
mais recente filme de Ken Loach, "Eu, Daniel Blake", é mais uma
pequena grande lição de realismo, mais precisamente de um realismo britânico
que não abdica de abordar as contradições internas do seu país, evitando as
generalizações fáceis, interessando-se antes pela existência particular de
personagens muito concretas — essa é, afinal, uma forma de humanismo e, num
certo sentido, de resistência humanista.
Desta
vez, Loach dirige o seu olhar para a personagem de Daniel Blake, um carpinteiro
de meia idade que precisa do auxílio da segurança social, mas que esbarra com
uma barreira de regras burocráticas que, em última instância, menosprezam a
singularidade de cada indivíduo. Nesse processo, ele vai construir uma tocante
relação afectiva com uma mãe solteira e os seus filhos.
O
papel de Daniel Blake surge interpretado pelo magnífico Dave Johns, veterano da
comédia e, em particular, da stand up, neste caso a dar provas de uma
sofisticada energia dramática. Afinal de contas, o interesse de Loach pelos
destinos individuais envolve sempre um intenso trabalho com os actores, aqui
especialmente sensível nas composições de Johns e Hayley Squires, a
protagonista feminina.
Com
"Eu, Daniel Blake", Loach entrou para a galeria muito reduzida dos
cineastas que já ganharam duas vezes a Palma de Ouro — esta aconteceu no
passado mês de Maio, a primeira ocorrera em 2006, com "Brisa de
Mudança".
João Lopes, tv.rtp.pt/cinemax/
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