ORNAMENTO
E CRIME
Rodrigo
Areias
Portugal, 2016, 90’, M/14
PRESENÇA DO REALIZADOR
FICHA TÉCNICA
Realização: Rodrigo Areias
Argumento e Diálogos: Pedro Bastos, Rodrigo Areias
Fotografia: Jorge Quintela
Montagem: Eduardo Nunes
Música: Rita Redshoes, The Legendary Tigerman
Interpretação: Vítor Correia, Djin Sganzerla, Tânia Dinis, António Durães
Origem: Portugal
Ano: 2016
Duração: 90'
CRÍTICAS
O realizador Rodrigo Areias reinventa os filmes noir americanos dos anos 40, deslocando o seu contexto e deixando a sua marca.
Rodrigo Areias prossegue o seu caminho de desconstrução do cinema de género, concedendo-lhe traços autorais que fazem do seu cinema um caso único no panorama português. Se em Estrada de Palha revisitara o western (fazendo, em termos muito próprios, uma espécie de western cozido à portuguesa), em Ornamento e Crime, deleita-se na reinvenção do filme noir. Mas a sua linguagem é tão marcante que, de alguma forma, se inscreve para além do próprio género, transformando-o num utensílio e não num fim em si próprio.
Tal como Edgar Pêra, que não por acaso aparece no próprio filme, no papel de realizador assassinado, Areias diverte-se com a autocitação, com o cinema a conviver e a descobrir a sua própria história, as suas próprias referências, mas nos antípodas de La La Land. Diz-se nos antípodas de La La Land sobretudo porque onde uns, numa produção luxuosa, procuram cor e brilho, Areias, com meios escassos, se deixa atrair pelas trevas. É no contraste do preto e branco que constrói um universo próprio, num conceito de noir pessoal, que até lembra, por essa capacidade de criar um universo, o finlandês Aki Kaurismäki. Areias é esteticamente muito seguro, implacável, sem cedência na pautação do ritmo, na coerência dos elementos, na consistência da montagem e da fotografia, que não vacila nem por um momento para fora do contexto que ele criou. Preto no branco.
Tal como em Estrada de Palha, em Ornamento e Crime, há uma adaptação fantasiosa de um universo externo e longínquo – os film noir americanos dos anos 40 – ao cenário português, de um tempo irreal, que apenas existe enquanto citação e memória do próprio cinema. Por isso, apesar de ter um detetive duro e charmoso, uma mão-cheia de mulheres fatais e uma trama sedutora, não deixa de ser, na sua essência, um filme sobre o próprio cinema.
Em termos estéticos funciona, com grande segurança, através da construção de quadros, com câmara fixa, em que a ação nunca é dada pelo movimento de câmara, apenas pela delineação minimal das cenas. As próprias personagens obedecem a essa cadência. Sobretudo Vítor Correia, num frigidíssimo papel de detetive, que nunca pestaneja, que nunca se assusta, fiel aos seus movimentos, com uma confiança demolidora. Cresce e desenvolve-se sempre ao ritmo de uma banda sonora que, aliás, funciona quase como uma personagem (o trabalho de Legendary Tigerman e Rita Redshoes é, desse ponto de vista, notável e enquadra-se plenamente do filme, alimentando-o e acolhendo-o).
Manuel Halpern, visao.sapo.pt
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